Angola profunda- Sousa Jamba



Após residir no Reino Unido e na América, passei vários anos no interior de Angola com o objetivo de compreender os modos de vida e trabalho das populações locais. Constatei que os angolanos rurais são extremamente laboriosos, contrariando a percepção errada de alguns que os consideram indolentes. Os habitantes das aldeias despertam cedo, por volta das 4h30 ou 5h00 da manhã, para laborar nos seus campos. Cultivam legumes, milho e outras culturas essenciais. No Planalto Central, recorrem às “olonaka”, áreas húmidas e férteis situadas junto aos rios, que permitem a prática agrícola ao longo de todo o ano. Entre as culturas plantadas destacam-se couves, abóboras, cenouras, tomates e uma vasta diversidade de produtos. Alguns constroem pequenos abrigos denominados “okachipundo” para se resguardarem da chuva e do calor.


As crianças participam nas tarefas agrícolas, mas dispõem igualmente de tempo para brincar. Os rapazes dedicam-se a caçar coelhos ou a recolher insectos e peixes, enquanto as raparigas colhem flores e confeccionam bonecas. Este equilíbrio fomenta nelas um sentido de responsabilidade aliado à criatividade. Alimentam-se de frutas locais e petiscos como nozes de açúcar, batatas-doces, mandioca, inhames, morangos e bagas silvestres. Ao entardecer, a comunidade reúne-se para actividades colectivas. Outrora, homens e mulheres banhavam-se separadamente nos riachos, uma prática tradicional que tem vindo a evoluir. Actualmente, muitos optam por duches com baldes ou sistemas rudimentares instalados nas habitações.



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As aldeias organizam-se em propriedades familiares. A residência principal destina-se aos pais, sendo complementada por anexos menores para os filhos adultos. Existe uma cozinha partilhada onde se preparam as refeições familiares. Algumas famílias, influenciadas pelo protestantismo, adoptaram o hábito de comer à mesa com utensílios, sob a presença de um cartaz alusivo a Cristo. 


No interior destas casas encontram-se mesas, cadeiras e toalhas de mesa, especialmente preparadas para receber visitantes. Os utensílios — pratos, garfos e copos — são adquiridos nos mercados de Huambo ou Katchiungo. As habitações possuem frequentemente amplas salas de estar e jardins adornados com flores, um costume que alguns atribuem à influência de missionários americanos e canadianos. As paredes exibem calendários cristãos, fotografias de Jesus, familiares ou, por vezes, figuras políticas. As mulheres orgulham-se de decorar os espaços com móveis elegantes, como cadeiras e mesas de qualidade. A televisão ocupa um lugar central, com grandes ecrãs de plasma a transmitir telenovelas turcas, preferidas pelos aldeões pela sua sobriedade em comparação com as brasileiras.


Os lucros provenientes da agricultura são reinvestidos na aquisição de triciclos motorizados (Kaleluia)  ou motorizadas.. Todos colaboram nos campos para sustentar a aldeia, evidenciando uma profunda ligação à terra e a convicção de que o trabalho árduo assegura estabilidade financeira. Uma família situada numa curva da estrada gere uma banca de mercado, onde automóveis e camiões param para comprar bananas, laranjas, limões, inhames, batatas e galinhas. Os membros desta família deslocam-se ao interior para adquirir galinhas, cabras e porcos, revendendo-os aos condutores com margem de lucro. Esses ganhos são reinvestidos, tendo uma vez adquirido uma carrinha de fertilizante para aumentar a produtividade agrícola. O patriarca possui terras que se estendem até ao rio, onde cultiva, mas mantém os detalhes em reserva, temeroso da inveja alheia.


As filhas deste agricultor estudam em Luanda, seguindo cursos de enfermagem, administração e estudos petrolíferos. Residem num complexo pequeno num bairro  da capital, equipado com quartos azulejados, duches, uma televisão de grandes dimensões e plantas decorativas. A comida sempre vem da aldeia.  Durante parte do ano, regressam à aldeia, trocando os jeans poe fatos de treino e  botas para auxiliar na propriedade agrícola. Os lucros são equitativamente distribuídos, permitindo-lhes adquirir telemóveis e outros dispositivos electrónicos. Esta combinação de dedicação ao trabalho e investimento na educação mantém-nas enraizadas nos valores essenciais, imunes às seduções do materialismo.


A vida em Luanda apresenta-se radicalmente distinta. Muitos dependem de empregos públicos ou de redes de contactos. Alguns limitam-se a actividades mínimas, passando o tempo a ver televisão, comer e dormir em casas superlotadas. Enfrentam o ruído, casas de banho partilhadas e a criminalidade, mas parecem conformados com a existência urbana. Nas aldeias, os fortes laços sociais funcionam como um mecanismo de controlo: um delito cometido por um indivíduo envergonha toda a família. Nos bairros de lata da cidade, essa pressão social é inexistente, contribuindo para uma maior incidência de criminalidade. Os citadinos frequentemente simulam prosperidade, vestindo roupas em segunda mão e fazendo compras apesar da escassez de recursos.

Para enfrentar estes desafios, é imperativo revitalizar os valores de trabalho árduo e apego pela terra observados no interior de Angola. Estes princípios tradicionais possuem o potencial de corrigir muitas das disfunções actuais. 


A terra constitui o alicerce onde os aldeões encontram segurança e exercem o seu labor. Com o acesso a ferramentas mais avançadas, semelhantes às que impulsionam a produtividade na Ásia, estas comunidades poderiam florescer e alcançar um desenvolvimento sustentável.


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