JESSÉ O GUARDA-REDES QUE BATIA PENÁLTIS: ADEUS KOTA, FICARAM AS LEMBRANÇAS



Naqueles tempos, na Jamba, antes da Assinatura do Acordo de Paz de 1991, num dia como o de hoje, 11 de Novembro, haveria uma partida de futebol entre as duas melhores equipas – a Estrela-Vermelha (E V.) e a Estrela-Negra (E.N.) –  para disputar a Taça da Independência. E se o jogo fosse decidido pela marcação de grandes penalidades, certamente, a E.N, que, maioritariamente, ganhava nos penáltis, venceria o jogo e Jessé marcaria o golo da vitória. Esta é a verdade!

Acho que o treinador da Estrela Negra, Arão Ngamba, dedicava, durante os treinos, muita atenção à marcação de penáltis, que era um dos fortes da Estrela-Negra. Razão pela qual, notávamos que a equipa jogava mais no contra-ataque, e os jogadores gostavam de queimar o tempo para levar o jogo aos penáltis. Notávamos que, quase sempre, eram os mesmos jogadores que se atrasavam em repor o esférico em jogo. Mesmo alguns meio-campistas que, geralmente, assumiam as marcações dos livres, levavam muito tempo a executar as faltas... aquilo era assim: colocavam a bola no local da falta, olhavam para os colegas, davam um sinal com as mãos, que significava bola nas costas da defesa, e corriam para chutar o esférico, mas, depois, paravam e gritavam para o árbitro, indicando para a barreira, dizendo que ela havia se mexido. - E o Lukamba, incomodado, dizia: já começaram! 



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O árbitro, Jaime, irmão do tio António, cozinheiro-chefe da Cooperação Internacional e pai do meu amigo Quinho, nosso ponta-esquerda dos juvenis da Estrela-Vermelha, ao ver o lenga-lenga do jogador, mandava um berro e ameaçava com o cartão. Isto foi o que nós víamos, e, como adeptos ferrenhos da Estrela-Vermelha, gritávamos, em coro: chuta a bola, paah! Mas se as coisas não estivessem a correr bem para eles, aí já era diferente: jogavam apressados, empurravam a bola para a grande área adversária, no intuito de movimentar rapidamente as unidades mais ofensivas junto à linha de defesa contrária, pressionando e obrigando os defesas a cometer faltas para penáltis ou, às vezes, colocavam o esférico à entrada da grande área, para explorar os remates de Camilo, que, diga-se, abono da verdade, tinha um pontapé potente - mandava "tchikandambala". 


Essa tática do mister Ngamba, algumas vezes, resultava. Por isso é que, o guarda-redes da E.V, o Estêvão, rebaptizado pelos adeptos como: Peixinho, Kangatô, Elástico, Kambissi, Aventureiro ou ainda Kandjila - gritava, com a sua voz grossa, quando visse o contra-ataque a ser desenhado, que, geralmente, começava pela defesa, assim: Alex, o capitão da equipa, endossava o esférico para Morais (Búfalo) ou para Tchituco ou ainda para Laranjeira, ou para Tchinendele; e lá iam trocando o esférico até chegar aos pés de Mecre, ou de Mwalupassa, ou de Avontade, ou de Tomé, ou de Horácio, ou de Nino Quarentinha, que, sem dar muitas voltas, lançava em profundidade, explorando a velocidade de Chidinho, do lado direito, ou de Kandiavity, do lado esquerdo, ou ainda de Isaías, ou de Sachiambo... Esse movimento rápido, apanhava a defesa da E.V de surpresa e fazia com que o Kangatô gritasse: oh, Ró! Oh Ró!...ou ainda: Guidoooo... Micheeel... Abdeeel... Lutukutaaa... Lourençooo ou Kilooo... e, imediatamente, algumas unidades do meio-campo corriam em socorro aos defesas: víamos Lito Borges, Ceto (Oceano), Satwala, Otávio e Kálias (Kaliambeque) em manobras mais defensivas, para evitar o pior, fazendo de tudo para evitar que o jogo se decidisse na marcação das grandes penalidades. Quando não fosse possível evitar, ficávamos desesperados, porque era nessa hora que Jessé, o guarda-redes que batia penáltis, voltava dar o seu show: marcava o seu golo e defendia uma ou outra bola. Foi sempre assim, Jessé nunca falhou um único penálti, e o Kangatô nunca defendeu uma única bola batida por ele. Aquilo era: bola para um lado, guarda-redes para o outro. O Kangatô foi sempre mamado - como se costumava dizer.

Na verdade, Jessé, o guarda-redes vitalício da Estrela Negra, oferecia muita segurança entre os postes. As suas mãos garantiram várias vitórias à sua equipa e os seus pés marcaram lindos penáltis. Ele era uma autêntica barreira intransponível. Apenas, avançados como: Zé Manuel(Kafuringa), Karriça, França, Big-Jô, Rock, Coelho, Zezito, Adidas, Tony Chivemba, Tony Chipenda, Kandambo, Ekangala, Farinha, Kayeye, Joaquim(da Mitaombamba) e Azevedo -  conseguiram violar a sua baliza.


Por isso, dá para concluir que Jessé foi dos melhores guarda-redes de todos os tempos daqueles tempos. 


O meu grande respeito e reconhecimento a ele e a todos aqueles que, mesmo vivendo em plena guerra, nas matas das terras do fim-do-mundo, alegravam-nos com momentos de bom futebol.


Voltarei...


Luanda, 11 de Novembro de 2022.

Gerson Prata


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