DE PORTUGAL PARA O MPLA VIA BICESSE



Para a UNITA, principal partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista em Angola, os Acordos de Bicesse, que se seguiram aos do Alto Kauango, mostram que continua por cumprir o que foi acordado com o governo do MPLA no processo de paz e reconciliação nacional.

Diz, ou dizia, a UNITA que “infelizmente, depois de Bicesse e do Luena [que pôs fim à guerra civil em Angola entre UNITA e as forças governamentais do MPLA], o governo de Angola, parceiro da UNITA no processo de Paz e Reconciliação Nacional não cumpriu, cabalmente, o seguinte: a devolução do Património da UNITA, a inserção dos seus quadros nos Conselhos de Administração das Empresas Públicas e a conclusão da entrega de pensões aos militares reformados”.

Os Acordos de Paz para Angola – Acordos de Bicesse, foram assinados, em Lisboa, em 1991, entre o então presidente angolano, José Eduardo dos Santos, e o presidente da UNITA, Jonas Savimbi, e mediados pelo governo português, representado por Durão Barroso, na altura secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.

O acordo visava pôr fim ao conflito armado e possibilitar as primeiras eleições legislativas e, até hoje, a única eleição presidencial, nos dias 29 e 30 de Setembro de 1992, que a UNITA diz terem sido marcadas “por uma fraude generalizada com evidências irrefutáveis, a que se seguiu o massacre de milhares de angolanos”, incluindo apoiantes e altos quadros da UNITA.



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O antigo primeiro-ministro português, ex-presidente da Comissão Europeia, ex-líder do PSD e velho e querido amigo do MPLA, Durão Barroso, considerou “positivas” as reformas que estão a ser empreendidas em Angola, mas avisou que a economia do país “é um desafio permanente”. Em matéria de bajulação só mudou o destinatário. Antes chamava-se José Eduardo dos Santos e hoje chama-se João Lourenço.

Durão Barroso afirmou que as reformas em curso em Angola são positivas, apesar de haver “muito trabalho a fazer”, pois a situação económica é “um desafio permanente”.

“Houve uma explosão demográfica, há que arranjar emprego para os milhares de jovens que todos os anos chegam ao mercado de trabalho”, apontou o antigo governante português.

Para Durão Barroso, “é uma situação muito difícil”, mas acredita “que se está a ir numa boa direcção”, vincou, destacando que esta é também a opinião das organizações internacionais e do Fundo Monetário Internacional (FMI) que implementaram um programa de assistência financeira no país.

Questionado sobre se a UNITA, sob a nova liderança de Adalberto da Costa Júnior poderá disputar o poder ao MPLA, sublinhou que Angola é um sistema político multipartidário onde se espera que as eleições se realizem na normalidade democrática.

“Todo o compromisso do MPLA – público e penso que não público – é com a democracia e hoje vimos aqui isso na própria apresentação que o MPLA faz da sua história, que apresenta como positiva a transição para uma democracia multipartidária”, disse.

O antigo governante português realçou: “O MPLA tem uma posição dominante no sistema político angolano, mas isso não quer dizer que não haja eleições, espero eu, em perfeita democracia”.

Durão Barroso lembrou as dificuldades sentidas quando, em 1987, foram iniciados os esforços do governo português para “virar a página colonial” e procurar estabelecer relações de amizade com os novos países.

“Nunca são fáceis as relações entre a antiga potência colonial e os novos países”, afirmou, indicando sobretudo o caso de Angola por causa da forma traumática, viciada à partida a favor do MPLA, como decorreram os acordos de Alvor e a relação particularmente intensa entre os dois países.

O antigo primeiro-ministro sublinhou igualmente a contribuição de Angola para a independência da Namíbia, o fim do regime de “apartheid” e até o desanuviamento da tensão entre os dois blocos, o Ocidente e o Leste, então divididos pela Cortina de Ferro, considerando que “a queda do muro de Berlim começou em África”.

Durão Barroso afirmou que o objectivo de Portugal foi sempre alcançar a paz e democracia em Angola (desde que o Poder ficasse sempre, como aconteceu, nas mãos do MPLA), sendo um mediador isento entre os dois movimentos em conflito — UNITA e MPLA — lembrando que foram os acordos de Bicesse, que permitiram a realização das primeiras eleições livres multipartidárias em 1992.

Sempre com e pelo MPLA

José Manuel Durão Barroso é, sempre foi, um camarada de primeira linha do MPLA e amigo íntimo do clã presidencial anterior, tal como continua a ser do clã actual. Em tempos defendeu em Lisboa que Portugal devia assumir uma relação “descomplexada” com Angola, frisando que eventuais “sobressaltos” são normais.

Os “sobressaltos são próprios das relações íntimas. A relação é boa mas não é perfeita, tem de ser descomplexada e mais assumida” e que venha a corresponder aos interesses dos dois países, disse Durão Barroso, que intervinha em 2014 na conferência organizada pela Câmara de Comércio e Indústria Portugal-Angola, sem especificar casos.

Por outras palavras, o camarada Durão Barroso entende que – como sempre foi a sua tese – Portugal deverá continuar a política de bajulação, subserviência e sabujice política, pelo menos enquanto o MPLA estiver no poder o que, calcula-se, deverá acontecer nos próximos 51 anos.

“Em Portugal temos a tendência de ver Angola de uma perspectiva portuguesa, mas é interessante olhar para Angola de outra perspectiva. Olhar de fora”, sublinhou na altura Durão Barroso acrescentando que as relações conheceram uma evolução nas últimas duas décadas.

Ou seja, Portugal deve olhar para Angola na única perspectiva válida, a do MPLA, sabendo que esta é (falta saber se continuará a ser) a torneira que mais alimenta Lisboa, seja a nível das lavandarias ou de outros negócios BESianos.

Para Durão Barroso, Angola sendo membro da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) tem resistido ao acordo de comércio livre com os Estados da região dando mais importância às ligações com Portugal, Brasil e China do que aos países vizinhos.

“Angola sabe que há uma posição dominante da África do Sul e não quer estar em segunda posição em relação à região para um dia integrar o ‘Economical Partnership Agreement’ numa posição de força”, considerou.

“Os africanos quando falam de Angola falam como um país especial. Joga a sua influência na região mas, ao mesmo tempo, não se quer deixar fechar em quadros sub-regionais”, reforçou o camarada Barroso.

Antigo secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, no início dos anos 1990, Durão Barroso recordou também os acordos de paz de Bicesse que conduziram à realização das primeiras eleições supostamente livres em Angola, em 1992.

Finalmente, Barroso disse estar confiante de que Angola privilegia três pilares fundamentais: o Estado de Direito “porque sem Estado de Direito não há confiança”; Educação “porque é a base de tudo” e a construção de infra-estruturas “porque são necessárias”, sobretudo para as relações com os países da região.

Sendo assim, sublinhou que Portugal — um dos maiores investidores estrangeiro em Angola em áreas não petrolíferas — deve apostar também na ajuda à educação, “a todos os níveis escolares”; formação profissional, agricultura e sectores como água e saneamento.

Em Dezembro de 2008, a Voz da América teve acesso ao relatório da Missão de Observadores da União Europeia, chefiada por Luísa Morgantini, às “eleições” de Angola e verificou que, afinal, a farsa foi vista mas, certamente por ordens superiores, não foi oficialmente denunciada.

Interessante é ver que, mesmo obrigados a comer e a calar, os observadores europeus não deixaram de verificar que, por exemplo, uma província “apresentou uma participação eleitoral de 108%” e que “não foram utilizados os cadernos eleitorais para a verificação dos eleitores no dia das eleições e como tal, não houve mais salvaguarda contra os votos múltiplos além da tinta indelével, e nenhum meio para confirmar as inesperadamente elevadas taxas de participação eleitoral”.

A isto Durão Barroso chama um Estado de Direito

O que disse de tudo isso o camarada Durão Barroso? Nada. Se fosse a UNITA a ganhar teria caído meio mundo e os arautos da democracia teriam reclamado a anulação das eleições. Como quem ganhou foi o eterno amigo MPLA, tudo está certo.

O relatório de Morgantini dizia, por exemplo, que a CNE “tomou decisões durante o período de eleições que demonstraram algum grau de parcialidade (…) sendo notória a falta de acesso dos representantes dos partidos políticos ao centro de apuramento central e a não acreditação de um número significante de observadores domésticos do maior grupo de observadores na capital”.

E então? Então nada! Foi uma aldrabice completa e com total cobertura da comunidade internacional, com Durão Barroso a dizer “porreiro, pá!”, certamente bem paga por alguma organização filantrópica do tipo Sonangol.

A Missão de Observação da União Europeia dizia ainda que “houve falta de transparência no apuramento dos resultados eleitorais, que não foi autorizada a presença de representantes dos partidos políticos nem de observadores para testemunhar a introdução dos resultados no sistema informático nacional e não foi realizado um apuramento manual em separado”, para além de “não terem sido publicados os resultados desagregados por mesa de voto e como tal não foi possível a verificação dos resultados”.

Em qualquer Estado de Direito críticas deste tipo, apesar de suaves e açucaradas, fariam com que as eleições fossem anuladas. Mas, tratando-se de um reino onde vale tudo, nada aconteceu. E não aconteceu porque tão criminoso é o que rouba como o que manda roubar. Ou seja, a União Europeia é tão criminosa quanto o MPLA, por muito que isso custe a Durão Barroso & Cª.

Segundo o relatório de Morgantini, “desde o período pré-eleitoral notou-se uma manifesta superioridade financeira e organizacional do MPLA em comparação com outras forças políticas”.

O relatório dizia: “A Missão europeia assistiu a repetidos casos de abuso dos benefícios do partido no poder durante a campanha, de igual modo, também se registaram casos de uso de recursos do Estado assim como o envolvimento de autoridades tradicionais e de funcionários públicos em actividades relacionadas com a campanha a favor do partido dirigente, situações que colocaram todas as outras organizações políticas em desvantagem”.

“Toda a gente sabe que no plano internacional Cabinda faz parte de Angola e a ONU reconheceu como parte integrante de Angola e mesmo ao nível europeu esse ponto de vista está definitivamente aceite”.

Quem terá dito uma tal barbaridade? Só podia ter sido um português, um amigo do MPLA, um vassalo de sua majestade o soba de Angola (tenha ele sido José Eduardo dos Santos ou seja hoje João Lourenço), um político que certamente não vive para servir mas, antes, para se servir… à grande.

Pois o autor dessa aberração e desse atentado à inteligência e à memória dá pelo nome de José Manuel Durão Barroso. Memória que recorda que o então primeiro-ministro das ocidentais praias lusitanas a norte, embora cada vez mais a sul, de Marrocos, Durão Barroso, foi convidado de honra do casamento de uma das filhas do Presidente que esteve 38 anos no Poder em Angola sem nunca ter sido nominalmente eleito.

Continuemos no âmbito dessa coisa que o poder julga que os cidadãos deixaram de ter: memória. Cabe, por isso, perguntar se Cabinda é o que disse e diz Durão Barroso, porque razão dirigentes da Resistência de Cabinda foram recebidos pelo então líder da Oposição (PSD)… Durão Barroso?

Como os portugueses já perceberam, são muitos os Josés que têm a memória tão curta e que, cada vez mais, até a acham desnecessária. Desnecessária, acrescente-se, quando não é em benefício próprio.

Fernando Lima, consultor político do Presidente da República de Portugal, Cavaco Silva, e seu ex-assessor de imprensa, considerou que “uma informação não domesticada constitui uma ameaça com a qual nem sempre se sabe lidar”.

Por alguma razão, quando visitou Angola, o MPLA fartou-se de dizer por todos os cantos e esquinas: «vem aí o camarada Durão». Se calhar também não se inibiu de outras coisas típicas dos opacos areópagos da política petrolífera.

Além disso, importa também dizer que muitos dos que ouvimos falar em voz alta não são mais do que reprodutores das vozes dos outros. Reprodutores bem pagos, acrescente-se.

Folha 8

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