Dossier 27 de Maio - "Este está entre os kotas" que levantava moral dos mais jovens na cadeia e campo do Tari na Kibala- Fernando Vumby

 


O Dossier 27 de Maio trata de eventos ocorridos em Angola em 1977, que tiveram impacto na vida de muitos jovens. Um dos personagens centrais dessa história é Ambrósio Lemos, que foi colega de cela e campo do Tari na Kibala, em S.Paulo. Neste texto, vou compartilhar minhas lembranças de Ambrósio e refletir sobre o silêncio e o compromisso político que o mantiveram calado sobre a morte de seu irmão.



Ambrósio Lemos era um jovem inteligente e promissor, envolvido na política e ativo no movimento MPLA. Infelizmente, ele perdeu seu irmão nos acontecimentos do dia 27 de Maio de 1977, um período marcado por violência e mortes. Embora tenha sobrevivido, Ambrósio foi obrigado a permanecer em silêncio pelo resto de sua vida, incapaz de falar sobre a perda de seu irmão ou até mesmo chorar por ele. Seu compromisso político com o MPLA o levou a ocupar cargos e patentes, mas também o obrigou a viver uma felicidade fingida, construída sobre o sangue e os destroços de tantas vidas perdidas.



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Apesar das circunstâncias, Ambrósio sempre foi cordial com os jovens que estavam na cela e no campo do Tari. Ele era fácil de se relacionar e nos dava força e conselhos para suportar o peso cada vez maior que carregávamos, jovens sem experiência lidando com um sofrimento tão intenso.


Lembro-me de uma ocasião em que joguei futebol com Ambrósio. Ele era o presidente de nossa equipe e sempre o via pulando de alegria quando eu marcava um gol, me aplaudindo como se eu fosse um jogador de alto nível. Mesmo quando fazia dupla com Leandro, um jogador excepcional, Ambrósio continuava a nos apoiar e incentivar.


No entanto, é doloroso ver que muitos mais velhos, que agora vivem apenas das memórias do passado, permanecem em silêncio sobre tantas coisas que sabem e vivenciaram durante o 27 de Maio de 1977. Eles poderiam ser mais úteis contando essas histórias às presentes e futuras gerações. Infelizmente, Ambrósio não é o único; conheço outros que também permanecem calados devido aos cargos que lhes foram dados para comprar seu silêncio até o fim de suas vidas.


O compromisso político e a oferta de cargos têm mantido muitos sobreviventes do 27 de Maio de 1977 em silêncio, incapazes de compartilhar suas histórias e experiências com as gerações futuras. Essa falsa felicidade, comprometedora e envenenada, em que vivem, muitas vezes os obriga a serem ainda mais brutais do que aqueles que um dia foram suas vítimas. É preciso quebrar esse ciclo e permitir que a verdade seja contada, para que a justiça possa prevalecer e evitar que tais eventos se repitam no futuro.


Fernando Vumby


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