DOSSIER 27 / 5 - "ARAGÃO ERA O NOSSO MEIO CAMPISTA"- FERNANDO VUMBY



Jogávamos sempre juntos na mesma equipe. Era bom.


Em dribles, pujança e grande poder de antecipação.


Eu me recordo ainda tão bem como se fosse hoje, até do calção amarelo escuro que usava na hora em que, para nos fazerem boa muxima.


E nos simularem que as matanças já estavam na reta final, nos davam a possibilidade.



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De apanharmos alguns restos do sol e aproveitávamos para fazermos umas partidas de futebol no pátio da cadeia de S.Paulo, por detrás da cela G.


Ao Aragão via-se que tinha no sangue, nas veias e nas pernas o talento para o futebol.


Se tivesse optado pelo futebol na sua juventude, teria sim uma carreira brilhante, pois tinha todos os condimentos que caracterizam um bom jogador.


Neste momento, estou a recordar-me de um lance que eu lhe tinha feito, em que ele matou a bola no seu peito.


E parecendo que estava a acariciá-la, aplicou uma finta ao mais velho Lito Breganha (kota Lito), que era um defesa daqueles que, se passasse o homem, a bola ficava.


Curioso, mesmo já quando nos davam essa possibilidade de apanharmos um pouco de raio solar, ainda assim.


Os interrogatórios que eram quase como pena de morte.


Porque se saía de lá sempre com sangue no corpo, se ainda te dessem a oportunidade de regressares para a cela, continuavam assim como as matanças.


Muitos evitavam irem apanhar o sol, preferindo ficarem nas celas para não serem vistos que ainda estavam vivos pelos bófias que entravam e saíam da cadeia.


Alguns deles só iam lá na procura de quem surrar, quem acusar de alguma coisa ou, para a noite, quando não, na calada da madrugada, ir buscar para matar.


Este Aragão é outro que vai morrer sem contar nada da sua experiência vivenciada na cadeia aos jovens dessa e futuras gerações como contributo histórico.


Proibido de abrir a sua boca em troca dessa felicidade podre que grande parte deles vivem.


Sobre os escombros de tanta gente que mataram para que Angola seja hoje este amontoado de criminosos impunes que estão a oferecer aos angolanos para viverem.


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