Órgão refere na Conta Geral do Estado 2021 que persistem irregularidades que tardam em ser superadas pelos organismos públicos e questiona a Assembleia Nacional sobre a utilidade do seu trabalho, numa altura que o Presidente da República desvaloriza a fiscalização preventiva aos contratos públicos prevista na lei.
O Tribunal de Contas voltou a fazer dezenas de recomendações para suprir irregularidades detectadas na gestão dos dinheiros públicos pelos vários órgãos do Estado, como ministérios, embaixadas, governos provinciais e empresas públicas, no âmbito do seu parecer obrigatório à Conta Geral do Estado. Na CGE de 2021 inscreveu 98 recomendações, sendo que 59 já vêm de anos anteriores sem que tenham sido acatadas pelo Executivo, situação que leva a instituição a questionar a "utilidade prática do parecer que emite".
"O plenário pelo facto de formular reiteradamente, em pareceres anteriores, recomendações sobre boas práticas, disciplina e transparência financeira que não têm sido atendidas, pelo Executivo, em virtude de as sucessivas CGEs apresentarem o mesmo tipo de irregularidades, coloca à Assembleia Nacional a questão de saber, qual a utilidade prática do Parecer que este Tribunal emite, em face dos incumprimentos e violações sistemáticos das normas em vigor", lê-se no documento coordenado pela Juíza Conselheira Elisa Rangel.
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O parecer do Tribunal de Contas deu entrada na Assembleia Nacional no mês passado, semanas antes de o Presidente da República, durante a tomada de posse do novo Juiz Presidente da instituição, Sebastião Gunza, praticamente ter desvalorizado também o papel do TC na fiscalização preventiva. João Lourenço revelou que quer ver menos fiscalização prévia, sobretudo nos contratos de infraestruturas ligadas directa ou indirectamente aos sectores produtivos. "Não gostaríamos de ver o Tribunal de Contas a aparecer perante a opinião pública como um factor de estrangulamento neste nosso ritmo de execução de projectos, particularmente de infraestruturas", disse.
Para o Chefe de Estado é preciso ver "em que situações o visto do Tribunal de Contas deve ser prévio, mas haverá com certeza casos em que se calhar não haverá necessidade do visto ser prévio". Ainda assim, admite que "o visto prévio deve ser emitido, mas nem em todas as situações haverá necessidade", defendeu.
Pronunciamento, que no entender de especialistas condiciona a acção do Tribunal de Contas na garantia da transparência, combate à corrupção e até nepotismo, na materialização do Orçamento Geral do Estado. "Este discurso do Presidente da República em nada abona para a transparência que defende. A fiscalização prévia do Tribunal de Contas é regida por lei, que define de forma clara onde esta é necessária. E ainda assim existem gestores públicos que não cumprem", disse sob anonimato um jurista.
Para esta fonte, os interesses do Governo não devem atropelar a lei. E se o chefe do Executivo quer menos fiscalização prévia tem de propor à Assembleia Nacional a alteração da legislação. "Para haver menos fiscalização tem que haver alteração da lei. Repito, a fiscalização preventiva está regulada. Não se trata de vontades. Depois reclamamos que as instituições não fazem o seu trabalho", concluiu.
TC detectou 4.133 inconformidades
No parecer à CGE 2021, o Tribunal de Contas detectou 4.133 inconformidades na execução orçamental por parte de vários órgãos públicos. O documento que aguarda a sua aprovação na "casa das leis" indica que as irregularidades encontradas pelo Grupo Técnico de Controladores Financeiros totalizaram o montante de 674,9 mil milhões Kz.
Estas inconformidades foram detectadas em 114 órgãos seleccionados, entre ministérios, administrações locais, empresas públicas e outras instituições suportadas pelo Orçamento Geral do Estado (OGE) em 2021.
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