Empresa ai ter de pagar ao Tesouro norte-americano 7,9 milhões de dólares (7,26 milhões de euros) por participar em subornos em Angola entre 2008 e 2014.
A holandesa Frank’s Internacional, fornecedora de materiais e serviços para a indústria petrolífera, admitiu que praticou atos de suborno em Angola por considerar que não ganharia negócios no país sem ser assim, refere documento do regulador de mercado norte-americano.
“A partir de setembro de 2007, a Frank’s tentou aumentar o seu negócio em Angola, mas soube através de uma empresa petrolífera, que a Sonangol [Empresa estatal angolana de petróleos] estava a bloquear a sua contratação”, refere um despacho da SEC norte-americana, equivalente à portuguesa Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a que a Lusa teve acesso.
Segundo o documento, datado de 26 de abril último, e que dá conta da decisão do regulador do mercado bolsista sobre a atuação da empresa, os administradores da Frank’s ficaram a saber, “inclusivamente, que a Sonangol tinha dado instruções ao cliente para recorrerem a um concorrente da Frank’s que, alegadamente, tinha feito um investimento financeiro superior em Angola”.
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Na exposição de factos dados como provados, e que resultaram numa multa de três milhões de dólares, a SEC refere que a Frank’s foi também informada por um executivo sénior da Sonangol que a petrolífera angolana “poderia mudar de ideias” se fosse criada uma empresa de consultoria e “pagasse cinco por cento do valor do contrato à empresa de consultoria para benefício de altos responsáveis da empresa estatal angolana”.
Perante estes factos, um responsável da Frank’s baseado na região “avaliou a gravidade da situação” e escreveu num email: “Não creio que seja um exagero dizer que estamos a lutar pela nossa sobrevivência”.
Assim, em outubro de 2007, a Frank’s tomou a sua decisão. “Não formou a empresa de consultoria, mas contratou um agente de vendas” em Angola, conclui-se no documento da SEC.
Assim, “sem realizar as devidas diligências e sem um contrato em vigor, a empresa contratou o ‘agente angolano’, que conhecia há mais de duas décadas o diretor nacional de outra subsidiária da Frank’s que operava em África”, acrescenta o documento do regulador.
Este agente em Angola “não tinha os conhecimentos técnicos necessários para defender a empresa junto da Sonangol e, de facto, não participou em reuniões técnicas com a petrolífera angolana”, menciona o despacho.
No entanto, tinha relações pessoais com autoridades de Angola e outros responsáveis da Sonangol, pode ler-se.
A Frank’s contratou então o agente, apesar de os funcionários da empresa estrangeira na região estarem cientes da “elevada probabilidade” de aquele utilizar “os pagamentos que recebia da Frank’s para subornar responsáveis do governo angolano”, o que terá acontecido entre janeiro de 2008 e outubro de 2014.
Para a SEC, esta probabilidade foi uma realidade: “alguns dos fundos foram desviados para um responsável do governo angolano para influenciar a adjudicação de contratos de serviços de petróleo e gás natural”.
Durante um período relevante, a Frank’s não dispunha de controlos contabilísticos internos adequados relacionados com a retenção e pagamento de agentes que interagiam com responsáveis públicos estrangeiros em nome da empresa.
Mas na exposição do caso, a SEC aponta ainda que “o facto é que depois de contratar o Angola Agent, as reuniões da empresa com a Sonangol passaram de reuniões curtas e improdutivas para encontros bem-sucedidos com a presença de aproximadamente 20 funcionários”.
A Frank’s International N.V. era um fornecedor global de serviços tubulares de engenharia, fabricava tubos e soluções especializadas de construção e intervenção em poços para a indústria do petróleo e do gás, constituído nos Países Baixos, com sede em Den Helder, na Holanda, e fundiu-se com a Expro Group Holdings.
Após o seu IPO (oferta pública inicial, ou dispersão e capital em bolsa) a 9 de agosto de 2013 até 1 de outubro de 2021, as suas acções passaram a ser transaccionadas na Bolsa de Valores de Nova Iorque.
A lei norte-americana criminaliza as empresas nacionais que operam no estrangeiro em matéria de corrupção e suborno, entre outros ilícitos financeiros, o que, na prática, faz com que mesmo operando fora dos EUA, tenham de cumprir a lei norte-americana.
Como em 2013, a Frank’s passou a ter títulos cotados na bolsa de Nova Iorque, ficou sujeita às regras das empresas norte-americanas.
O que está em causa neste processo da SEC?
A empresa holandesa Frank’s Internacional vai ter de pagar ao Tesouro norte-americano 7,9 milhões de dólares (7,26 milhões de euros) por participar em subornos em Angola entre 2008 e 2014, segundo despacho do regulador de mercado norte-americano.
De acordo com o despacho da comissão da Securities and Exchange Comission (SEC), na sigla em inglês), a que a Lusa teve acesso, a empresa, fornecedora de materiais e serviços para a indústria petrolífera, terá de “pagar a restituição de $4.176.858 e juros de mora de $821.863 e uma sanção pecuniária civil no montante de $3.000.000 à Securities and Exchange Commission para transferência para o fundo geral do Tesouro dos Estados Unidos”, num total de quase 7,3 milhões de euros.
Em causa estão esquemas de suborno a que a companhia, com títulos cotada na bolsa de Nova Iorque, assumiu recorrer por não estar a conseguir, de outra forma, ganhar contratos em Angola.
Segundo o documento que determina a sanção contra a Frank’s, datado de 26 de abril deste ano, a SEC explica que a empresa foi informada por angolanos que tinha de criar uma consultora para onde seriam canalizados os subornos que lhe permitiriam ganhar os contratos no mercado angolano.
“Entre janeiro de 2008 e outubro de 2014, aproximadamente, a Frank’s pagou comissões a um agente de vendas em Angola, mesmo tendo em conta que os responsáveis da subsidiária da Frank’s sediados na região sabiam que havia uma grande probabilidade de o agente utilizar as comissões para subornar funcionários do governo angolano em nome da Frank’s”, acrescenta o despacho da SEC.
“De facto, alguns dos fundos foram desviados para um responsável do governo angolano para influenciar a adjudicação de contratos de serviços de petróleo e gás natural”, sublinha o documento adiantando que, durante o período relevante, a Frank’s “não dispunha de controlos contabilísticos internos adequados relacionados com a retenção e pagamento de agentes que interagiam com funcionários públicos estrangeiros em nome da empresa”.
Após o IPO (dispersão de capital em bolsa da Frank’s Internacional, que decorreu em agosto de 2013, o agente em Angola “desviou os fundos que recebeu da Frank’s Angolan Operations para contas offshore detidas por empresas cuja propriedade final não era identificável. Durante este período, depois de se tornar emissor, a Frank’s Angolan Operations obteve cinco novos contratos em Angola”, acrescenta o documento.
Naquele período, a empresa petrolífera estatal angolana, a Sonangol, atribuiu concessões a grandes empresas petrolíferas internacionais, concedendo os direitos de exploração e produção de petróleo em áreas onshore e offshore, designadas por blocos.
Até 2012, o presidente da petrolífera era Manuel Vicente, que mais tarde veio a ser vice-presidente de Angola, sendo Presidente o histórico José Eduardo dos Santos.
Na exposição do caso, a SEC diz que a Frank’s Angolan Operations, apesar de ter sido contratada por algumas das grandes empresas petrolíferas internacionais que receberam as concessões, estava a ser preterida porque as companhias não queriam contratar “fornecedores desfavorecidos pela Sonangol”, lê-se no documento.
Assim, a solução encontrada pela empresa foi angariar um agente angolano, para quem canalizaria verbas que iriam garantir que a empresa receberia novas adjudicações.
Entre 2008 e 2014, “as empresas do agente de Angola receberam “aproximadamente 5,5 milhões [cerca de cinco milhões de euros] das operações angolanas da Frank’s, uma parte dos quais foi paga a um responsável de Angola”, adianta o documento.
Mas a Frank’s recebeu “pelo menos $4.176.858 [3,7 milhões de euros]em lucros líquidos pós-IPO dos seus contratos com empresas petrolíferas em que a Sonangol era o cliente final e em relação aos quais um responsável de Angola, ou outros funcionários da Sonangol, tinham autoridade para tomar decisões”.
Num acordo prévio à decisão final da SEC, com base numa proposta da Frank’s, a empresa comprometeu-se em cooperar, incluindo através da disponibilização de testemunhas de fora dos EUA para entrevistas, apresentar voluntariamente documentos relevantes e partilhar factos descobertos durante a sua investigação interna, incluindo factos relacionados com condutas que ocorreram antes de se tornar um emitente.
As medidas de correção incluíram o despedimento dos funcionários envolvidos, o fim da relação com o agente de Angola, a melhoria dos seus controlos contabilísticos internos e o reforço do seu ambiente de controlos internos e do seu programa de conformidade na sequência da sua fusão com o Expro Group, da qual resultou a Expro Group Holdings.
“O requerido deverá, no prazo de 14 dias a contar da data de entrada do presente despacho, pagar a restituição de $4.176.858 e juros de mora de $821.863 e uma sanção pecuniária civil no montante de $3.000.000 à Securities and Exchange Commission para transferência para o fundo geral do Tesouro dos Estados Unidos, nos termos da secção 21F(g)(3) da Exchange Act”, conclui-se no documento.
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