O espaço mediático - tradicional e virtual - vem sendo ultimamente invadido por reiteradas "denúncias" - as aspas são propositadas - contra o juiz Joel Leonardo, presidente do Tribunal Supremo. Aliás, pode-se dizer que isso tem sido uma constante desde 2017.
Altas entidades do Poder Judicial têm estado volta e meia submetidas a uma barragem de acusações, sobretudo nas redes sociais, posteriormente retomadas pela media "tradicional".
Primeiro foi o juiz Rui Ferreira, em 2018, que acabou mesmo se demitindo; depois Exalgina Gamboa, presidente do Tribunal de Contas ainda agora sob essa pressão; e, por altura das eleições, o presidente da CNE, Manuel Pereira da Silva e Laurinda Prazeres, a n.º 1 do Tribunal Constitucional. Não se pode dizer que isso em si seja mau.
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Acaba por ser uma espécie de participação popular na luta contra a corrupção e nepotismo, uma das grandes bandeiras de João Lourenço, presidente do MPLA e da República. Esse combate - que já criou muitos inimigos - foi destaque nos programas eleitorais de 2017 e 2022.
Portanto, sufragados nas urnas. É do MPLA a iniciativa e a estratégia que conduz essa luta, por isso é o principal interessado que ela chegue a bom porto. Por outro lado, e enquanto partido que suporta o Executivo, tem responsabilidades de Estado a que não se pode eximir sob pena de este entrar em colapso.
Tem a obrigação de ser prudente e ponderado e, ao contrário do maior partido na oposição, não se dar ao luxo de arroubos populistas. No exercício desta prudência, deve-se ter em conta que, em relação a Joel Leonardo, o volume das "denúncias" dá fortes indícios de uma campanha orquestrada.
Uma cabala para derrubar o homem. Só que, goste-se ou não, o presidente do Tribunal Supremo em Angola é a entidade máxima do Poder Judicial. Com o Presidente da República e a Presidente da Assembleia Nacional, um dos três pilares do Estado Democrático de Direito.
Ora, como sabemos mexer num pilar sem salvaguardar os necessários equilíbrios, é perigar o edifício do Estado que somos todos nós. É precisamente aí que o grupo parlamentar da UNITA peca gravemente, ao "exigir" a demissão imediata de Joel Leonardo, antes mesmo de qualquer investigação que prove se o homem é inocente ou culpado.
Há imperativos de Estado e de Direitos Humanos que não levou em conta. O GP/UNITA tem a obrigação sacrossanta de proteger as instituições do Estado, onde se incluem os tribunais e ele próprio; deve, por isso, levar em consideração que Joel Leonardo, como qualquer outro cidadão, goza de dois direitos constitucionalmente consagrados: ao bom nome e à presunção da inocência.
Por isso, não pode ser "condenado" apenas com base num conjunto de "denúncias" que até podem ser falsas, criadas com o objectivo de sujar o bom nome e a reputação do cidadão em causa, bem como criar instabilidade na estrutura do Estado. Mais uma vez, a UNITA demonstrou uma deplorável falta de sentido de Estado. Mais deplorável ainda num partido com pretensões de ser governo. Assim a UNITA governaria com base em calúnias e intrigas? Se sim, está mal. Muito mal...
Poderíamos, por mera hipótese, ater-nos ao provérbio "À mulher de César não basta ser honesta; tem que parecê-lo", para justificar essa "exigência" da UNITA: mas a isso há que contrapor a facilidade dos dias de hoje em criar e disseminar "fake news" (notícias falsas) no mundo virtual, a maior parte das vezes sob anonimato.
Se tivermos em conta que, no exercício das suas funções, o presidente do Tribunal Supremo é o ponta-de-lança do combate contra a corrupção, não fica difícil visualizar um cenário em que, por vingança ou procurando proteger-se, os "marimbondos" queiram forçar a sua demissão tal como fizeram com o seu predecessor.
Mais um motivo que desaconselha acções intempestivas e precipitadas. Último ponto neste quesito, o Presidente da República não pode demitir o Presidente do Tribunal Supremo como o faria com um membro do seu Executivo.
Por força da separação de poderes, apenas o poderia fazer após cumprido todo um processo definido por lei. Processo esse que, como o GP/UNITA sabe (ou deveria saber), se inicia sempre por uma investigação, no caso do DNIAP.
Ora sabendo isso, não se compreende como pode fazer exigência tão absurda. Por isso, se repararem, a UNITA está sozinha nesta posição: tanto a Associação da Magistratura Judicial como os vários membros da sociedade civil que se pronunciaram na matéria ficaram-se pela exigência de uma investigação.
Agora, quanto às acusações: elas vêm essencialmente do site Club K. Publica pretensas provas e o seu rosto visível, José Gama, desafia mesmo as autoridades a realizar uma investigação para a qual estaria disposto a colaborar, apresentando as provas que diz possuir. E esse é o caminho que se deve seguir. Essa investigação é urgente e necessária. Tanto para limpar o nome do juiz gravemente manchado - e por via dele, todo o sistema judicial - como para pôr a nu a perfídia dos seus detractores.
O próprio juiz Joel Leonardo deveria tomar a iniciativa de despoletar esse processo, até mesmo para mostrar que "quem não deve não teme". E caso as "denúncias" se revelem falsas, os seus responsáveis deverão ser severamente punidos pelos organismos competentes e nos termos da lei.
Finalmente, uma palavra sobre a comunicação institucional do juiz-presidente e do próprio Tribunal Supremo. O silêncio a que assistimos da parte desta instituição, perante as graves e reiteradas acusações, acaba sendo o exemplo mais recente da postura dos gestores públicos de topo: "os cães ladram e a caravana passa". Ou ainda, de "aplacar na trincheira e esperar que o inimigo acabe as balas". Só que, na maior parte dos casos, "o ladrar é como as balas, e estas não acabam".
Continuam a assobiar à nossa volta até que uma das muitas no atinge, fere ou mata. Essa terá sido a razão pela qual o Presidente da República elegeu como lema desta governação "trabalhar mais e comunicar melhor".
Neste sentido, ao nunca responder de forma inteligente e estratégica às acusações que vem sofrendo há cerca de dois anos, o juiz-presidente e o próprio Tribunal Supremo facilitaram e de que maneira os seus detractores. Em Comunicação Institucional, essa estratégia revela-se sempre suicida.
Goebbels, o propagandista de Hitler, provou que "uma mentira repetida muitas vezes se torna verdade". Pelo menos na percepção daqueles que a ouvem. De tão repetidas as acusações a Joel Leonardo, as pessoas hoje já se perguntam se afinal, algumas pelo menos não serão verdade. Ele próprio se cala e, como "quem cala consente"...
A reputação do presidente do Tribunal Supremo está de tal maneira de rastos que dificilmente poderá ser restaurada a ponto de poder continuar a ter moral de continuar a exercer o cargo. A lição que fica, é urgente e necessário cada instituição do Estado reforçar as suas estruturas de comunicação.
O abaixamento de categoria de direcção para Departamento da estrutura responsável pela Comunicação Institucional e Imprensa não foi definitivamente um bom passo. Vai até em contramão das grandes instituições que, pelo mundo fora, reforçam cada vez mais as suas estruturas de comunicação.
Até Governos que tinham eliminado os departamentos ministeriais responsáveis pela Comunicação, tornaram a instituí-las como o Brasil. Moçambique está a caminhar pelo mesmo caminho. Isso porque, nunca como agora a Comunicação foi tão importante para a gestão reputacional de entidades e instituições. Exactamente por causa das TICs e das redes sociais.
É hoje, quase matéria de sobrevivência para as instituições, a capacidade de reagir efectiva e eficazmente aos ataques que lhes sejam dirigidos por via de campanhas de comunicação, explícitas (above the line) e camufladas (under the line).
Só uma investigação pelos organismos competentes poderá aferir se as "denúncias" contra o presidente do Tribunal Supremo são verdade ou estamos perante uma cabala. Até lá, goza da presunção de inocência. Não pode ser condenado, nem à demissão até e se, essa investigação prová-lo culpado. Assim, mandam a Constituição e a lei.
Esteve por isso muito mal - mais uma vez - o grupo parlamentar da UNITA ao "exigir" - não se sabe a quem e com base a que leis - a sua demissão. Em contraponto, estiveram muito bem as instituições que se pronunciaram a favor de uma investigação.
Celso Malavoloneke para o Novo Jornal
𝐉𝐮𝐧𝐭𝐨𝐬 𝐒𝐨𝐦𝐨𝐬 𝐌𝐚𝐢𝐬 𝐒𝐞𝐠𝐮𝐫𝐚𝐧𝐜̧𝐚 𝐒𝐨𝐜𝐢𝐚𝐥
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