“Portas e janelas. Protagonizado”? - Graça Campos



Parte dos 180 mil milhões de kwanzas (426, 4 milhões de dólares) do crédito adicional suplementar que o Presidente da República autorizou em Abril para “suportar as despesas relacionadas com funcionamento e investimento do sector de Ordem e Segurança Pública” deveria ser, obrigatoriamente, destinada ao recrutamento de bons falantes da língua portuguesa para melhorar a comunicação da Polícia.

O comunicado do Departamento de Comunicação Institucional e Imprensa do Comando Provincial da Polícia do Cuanza Norte através do qual a instituição anuncia o assassinato de 2 trabalhadores angolanos da central hidroeléctrica de Caculo Cabaça é um verdadeiro atentado à língua oficial de Angola.


Nesse comunicado, os pontos e as vírgulas são usados não em obediência a qualquer regra gramatical. São usados arbitrariamente.




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Os gravíssimos atropelos ao português tornaram ainda mais difícil compreender a razão por que a Polícia matou dois cidadãos e feriu outros oito em virtude de reclamarem salários mais dignos.

A má relação do Departamento de Comunicação Institucional e Imprensa da Polícia do Cuanza Norte com a língua portuguesa acabou por trair a própria instituição. No comunicado, a Polícia confessa que atirou mortalmente contra “o grupo de trabalhadores insatisfeitos” porque esses supostamente ameaçavam a “integridade física dos cidadãos chineses”.

O precário domínio da língua levou, ainda, a Polícia a confessar que a abertura de um “inquérito” para apurar as circunstâncias em que tirou a vida a dois cidadãos e feriu outros é uma balela, uma vez que ela própria já enumera as razões por que disparou indiscriminadamente contra angolanos. A primeira razão seria uma pretensa ameaça à “integridade física dos cidadãos chineses”;  a outra seria um suposto “défice da correlação de forças”.

A abertura de “um inquérito com a envolvência dos órgãos de investigação, para a averiguação dos factos” é, vamos repeti-lo, um escárnio às vítimas de mais um acto de violência gratuita.

O bom domínio da língua portuguesa não disfarçaria o que parece ser já uma vocação da Polícia angolana abater cidadãos indefesos, mas ajudá-la-ia, e muito, a comunicar-se melhor com a opinião pública.

Por isso, desviar parte do bilionário reforço orçamental autorizado pelo Presidente da República para cursos intensivos de língua portuguesa ajudaria muito.

Não que fosse colocar um freio nos dedos dos agentes da Polícia, mas ajudaria a perceber que o emprego da vírgula e do ponto obedece a regras. 

Isso de “(...) portas e janelas. Protagonizado (...)” é de gente que tem de regressar imediatamente aos bancos dos primeiros anos da escola primária.




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