IVA - A pimpa do governo de que as isenções só trazem vantagens



Desde a entrada em vigor do IVA que, à semelhança do funcionamento deste imposto noutros países, convivemos com algumas isenções que lhe são aplicáveis, em que os agentes económicos não liquidam o IVA nas suas transacções. São exemplo disso os serviços médicos e de ensino, a locação e transmissão de imóveis e a comercialização de produtos petrolíferos.


Numa análise superficial, podemos ser levados a considerar que as isenções são sempre favoráveis, nomeadamente para o consumidor, uma vez que, nestes casos, o IVA não onera o preço a pagar pelos bens e serviços.



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A verdade é que o IVA é um imposto que, na sua génese, deve garantir a neutralidade fiscal ao longo do circuito económico e assenta no princípio de que, por regra, deve ser suportado unicamente pelo consumidor final - i.e., ao longo da cadeia, um agente económico cobra IVA e o outro recupera-o do Estado, e assim sucessivamente até se chegar ao consumidor final, que o suporta integralmente.

Desmistificando o mundo aparentemente encantado das isenções, quando um agente económico não cobra IVA nos bens e serviços que fornece, regra geral não pode recuperar o imposto que lhe é facturado a montante, sendo um custo que acabará por ser repercutido, ainda que não enquanto tal, no preço que pratica junto do consumidor final ("PVP").

Ou seja, o consumidor de uma transacção isenta de IVA, aparentemente menos onerosa por não ter o tal valor de imposto, acaba sempre por pagar, sem se aperceber, um IVA "oculto" que corresponde ao valor de imposto que o fornecedor não conseguiu recuperar, somente porque as regras não o permitem, e que naturalmente o incluiu, na medida do possível, na formação do seu PVP.

A título de exemplo, vejamos a isenção de IVA aplicável à locação de imóveis com fins comerciais que, regra geral, cria uma ineficiência fiscal não só para o locador como também para o locatário: como o locador não cobra IVA nas rendas, não poderá recuperar o imposto incorrido, seja com a construção do imóvel ou em obras de reabilitação, serviços sujeitos a 14% de IVA, representando este imposto um encargo efectivo da sua actividade, levando-o a tentar incrementar o valor da renda a cobrar, caso as condições do mercado assim o permitam, sob pena de ver reduzida a rentabilidade do negócio.

Ora, sendo o locatário um sujeito passivo, com actividade que lhe permita deduzir IVA, seria mais vantajoso que a renda fosse tributada, aliviando o locador do encargo do IVA incorrido a montante que, de outra forma, é registado como um custo e que o leva a repercutir, se o conseguir, tal encargo no preço da locação. Caso não se aplicasse a isenção de IVA na locação, o locador poderia atribuir um valor mais reduzido à operação, ainda que acrescido de 14% de IVA, imposto que poderia ser recuperado pelo locatário e não seria parte do preço da locação.

Ainda que as isenções se justifiquem, muitas vezes por razões de ordem social, entendemos fazer sentido introduzir-se na legislação a possibilidade de os contribuintes optarem pela tributação em IVA de algumas das operações isentas de IVA, nomeadamente no caso da locação e transmissão de imóveis, através do mecanismo de "renúncia à isenção", à semelhança do que vigora noutras jurisdições e que, em Angola, já é possível na venda de medicamentos e de livros.

Uma outra isenção muito penalizadora, e neste caso para os agentes económicos, é a da venda de produtos petrolíferos por parte de entidades que têm postos de abastecimento próprios ou mesmo concessionados a terceiros, mas aos quais fornecem combustível.

A venda de produtos petrolíferos tem preços regulados, não podendo os operadores definir livremente o PVP destes produtos e comercializá-los a "preço de mercado", nem podendo consequentemente incluir, na formação dos preços, os custos reais que têm com a actividade (nomeadamente os de estrutura e investimento), os quais não estão a ser recuperados em valores muito significativos, designadamente pelas entidades que estejam, de facto, com planos de investimento consideráveis.

Um agente económico que realize investimentos significativos com a construção, rebranding e manutenção de postos de abastecimento (despesas sujeitas a 14% de IVA), vê-se, por um lado, quase totalmente limitado na dedução do IVA incorrido (por ter essencialmente uma actividade isenta), e, por outro, impedido de repercutir o custo adicional que o IVA representa, na sua actividade, ao consumidor final.

O IVA não deveria representar um custo na esfera dos agentes económicos e, por regra, apenas deveria ser suportado pelo consumidor final. É essa a mecânica deste imposto e o princípio basilar de qualquer regime de tributação assente num imposto do tipo IVA.

A nosso ver, o impacto nefasto da isenção de IVA na comercialização de produtos petrolíferos, e considerando que os preços são regulados, poderia ser evitado na esfera dos agentes económicos por uma de duas vias: ou a da tributação a uma taxa reduzida de IVA, ou a da manutenção da isenção mas que permitisse, na esfera dos operadores, a recuperação do imposto incorrido a montante (transformando uma isenção incompleta naquilo que, tecnicamente, se qualifica como uma isenção completa, que não impede a recuperação do IVA incorrido).

Por via da tributação reduzida, por exemplo, a uma taxa de 1%, e aceitando-se um aumento desta ordem ou ligeiramente inferior no PVP, que praticamente se manteria inalterado considerando todas as questões sociais a ele associadas, poderiam eventualmente eliminar-se as distorções e efeitos adversos da isenção para os operadores. De facto, sem prejuízo de ser necessário um estudo aprofundado destes impactos na esfera dos operadores, nomeadamente para se acautelar tanto quanto possível a sua margem de venda, a recuperação do imposto incorrido nos custos da operação seria conseguida. Tal como seria possível caso fosse aceite a dedução do IVA a montante, mesmo com a venda de combustíveis isenta de IVA, sem qualquer alteração no preço, caso a legislação qualificasse esta isenção de completa.

Não nos esqueçamos que a montante da venda dos combustíveis não está apenas a sua compra (sem IVA), mas também significativos investimentos na rede, nos postos, em toda a distribuição, todos eles onerados de IVA que não tem sido recuperado e impacta muito negativamente na saúde financeira e económica dos operadores.

Para mantermos saudável e próspero o investimento no país, devemos ter em consideração todos os coadjuvantes que podem ser grandes apoios para todos. Sabemos que as adaptações vão sendo feitas consoante a prática e, com os olhos nisto e vendo exemplos externos de sucesso, parece-nos que há sempre caminhos de melhorias a correr.


*Partner e Senior Manager da Deloitte




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