O Metrô é prioritário? Sim! - Graça Campos



1.

Nas redes sociais há um acalorado debate sobre se a construção do Metrô é ou não prioritária.


Estatisticamente, o debate pende para a facção que desaprova o projecto. 


Para mim, os angolanos e, em especial, os luandenses, mais uma vez estão a ser arrastados para um debate pueril. É um debate estéril, que não leva a lado algum. Ou melhor, leva, mas a beco sem saída.   



O que deveria ser é prioritário mesmo é a construção de um novo paradigma em que o cidadão seja chamado a participar na vida do país, logo na construção da sua própria vida. Um paradigma em que o cidadão não seja uma massa inanimada, que precisa que alguém decida por ele. Precisamos de um paradigma em que o cidadão escolha ele próprio quem quer para Presidente da República, quem quer para administrador da sua área de residência. Um paradigma que dispense a intermediação dos partidos e do Presidente da República. É disso que precisamos. Essa tem de ser a prioridade dos angolanos. Precisamos de um paradigma em que o cidadão não olhe para o lado face a um descarado acto de corrupção de todo o aparato judicial por parte do Presidente da República, como é indiscutivelmente o Decreto 69/21, que convida  magistrados do ministério Público e Juízes ao repasto cozinhado com o que resulta da luta contra a corrupção.


Precisamos de um paradigma em que juízes e magistrados não sejam os primeiros e principais beneficiários de imóveis que estão a reverter para o Estado. 


Precisamos de mudar esse paradigma. Precisamos de um paradigma que envolva o cidadão na discussão e tomada de decisão. Precisamos de um paradigma é em que o munícipe sejam consultado antes da realização de obras estruturantes. 


Neste momento, o Presidente da República está no Cunene. Foi ver como estão a ser aplicadas as recomendações que deixou quando esteve lá há pouco mais de um ano. O que está a ser feito no Cunene é aquilo que o Presidente da República e os “cientistas” do seu gabinete entendem que deve ser feito. O que está a ser feito não é um programa que resultou da auscultação da sociedade, nomeadamente da Academia. O que está a ser feito para estancar ou mitigar os efeitos da seca no Cunene, Namibe, Kuando Kubango e Huíla é aquilo que o Presidente da República entende que deve ser feito porque em Angola criou-se o hábito – e o próprio Presidente acredita nisso – que ele sabe e pode tudo.


Como o Presidente da República vive convencido que sabe e pode tudo, então permite-se, por exemplo, nomear e exonerar governadores para Luanda sem dizer a ninguém por que o faz.


Nomeada há sensivelmente uma semana, a nova governadora por certo que até agora ainda não sabe por que foi nomeada. Quando foi empossada, não lhe disseram o que esperam dela.


O PR não impõe aos governadores contratos-programa. Por isso é que vemos que cada um que é nomeado escolhe arbitrariamente a área em que pretende olhar com maior acuidade.


O PR fez da gestão do país um segredo dele e de uns poucos. Só ele sabe por que nomeia e exonera este ou aquele.


Este e outros paradigmas, que fazem de Angola como que uma coutada privada, é que têm de ser prioritariamente quebrados.


2. 


O Metrô é um detalhe tão essencial como uma boa auto-estrada ou um bom hospital público no Kuando Kubango ou noutra localidade.


Nas redes sociais, sobretudo, alguns insistem que não é prioritário.


Mas não é prioritário para quem? 


A resposta a esta pergunta depende de cada um, porque cada um sabe a sua dor.


Pergunte-se a quem mora no Cacuaco e trabalha no Benfica se priorizará a construção do Rio Luanda ou se priorizará o Metrô que lhe levará até às portas de casa ou do serviço. Pergunte-se a quem mora do Zango 5 e estuda a noite no Morro Bento. Qual é a prioridade para ele?


A ordem de prioridades é relativa. Infelizmente, neste país tudo é prioritário; este país vem sendo adiado há 45 anos.


A saúde tem que ser vista como prioridade; a educação tem que ser vista como prioridade; o saneamento básico tem de ser tomado como prioridade; mas a mobilidade das pessoas também é uma prioridade. Só os sádicos ficam indiferentes aos imensos ajuntamentos das pessoas nas paragens dos táxis e dos autocarro; só os sádicos faz bem ver o desespero de pessoas que ficam nas ruas até altas horas da noite sem saberem se lhes caberá a ventura de apanharem um táxi tardio.


Em suma: a polémica sobre se o Metrô é ou não prioritário só aproveita aos populistas e oportunistas.


Aqueles que, nas redes sociais, se apressam a manifestar oposição à construção do Metrô se calhar nem sabem do que falam. À custa do Metrô está a ganhar terreno a corrente do Só Para Contrariar. Há gente a fazer barulho apenas porque politicamente isso dá algum dividendo. Aqueles que se distinguem nas críticas ao projecto não o fazem estribados na ciência, em razões técnicas, ambientais ou outras. 


Fazem-no apenas porque é bom contrariar.


Há dias, nas redes sociais, alguém perguntava onde encontrar o estudo técnico de suporte ao Metrô. 


Sucede que o autor desse poste esteve fisicamente no lançamento do Metrô. Ele até tomou a palavra, mas não pediu que lhe mostrassem o estudo técnico. Estavam lá todas as pessoas que lhe poderiam responder a tudo. Mas não fez a pergunta ali. Guardou a pergunta para as redes sociais, porque isso é mais chique. 


Isso é populismo.


Como é também sustentar o discurso de que a construção do Metrô acentua a fome, a doença ou a falta de educação neste país. 


Não há nenhum nexo de casualidade.


A ausência de Metrô não fez de Luanda uma urbe recomendável do ponto de vista de saneamento básico; a ausência de Metrô em Luanda não travou o aumento da miséria e da mendicidade; a ausência de Metrô não construiu mais escolas, hospitais; não criou mais fogos habitacionais para atender a crescente demanda; não fez de Luanda uma cidade segura e boa para viver.


A construção do Metrô não acentuará esses e outros déficites. Pelo contrário, vai atenuar, se não mesmo resolver, uma intensa dor de cabeça para uma imensidão de luandenses, que é a escassez de transporte público.


O Metrô não desviará recursos que deveriam ser destinados a programas sociais – Educação, Saúde, Saneamento Básico, etc – pela simples e ponderosa razão de que a participação financeira do Estado será indirecta. 

Correio Angolense 



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