«Farináceos» retornam a velhas trafulhices (Parte 1)



Depois de terem andado algum tempo sumido dos holofotes, os empresários Rui Costa Reis e Carlos Alberto Santos estão de volta com as ilegalidades e tropelias a que nos habituaram no passado.

Ao que soube o Correio Angolense, venderam a quase totalidade da Kikolo – Sociedade Industrial de Moagens SA, empresa de que eram accionistas maioritários, a um homem de negócios itálo-libanês pelo montante de 15 milhões de dólares. Mas, depois de terem sido pagos, pretendem reassumir o controlo da moagem sem fundamento algum. É caso para dizer que as falcatruas fazem parte do DNA de ambos os «farináceos».



Mas a história conta-se rápida. Tecnicamente falida, fazia mais de dez anos que a fábrica situada no Kikolo e vocacionada à moagem de cereais, farinha de trigo e de milho sobretudo, estava totalmente paralisada e com os seus equipamentos industriais já praticamente em estado obsoleto. Numa palavra, em coma absoluto. Seria necessário um esforço de investimento hercúleo para que ela voltasse a dar sinal de vida.


Diga-se, em abono da verdade, que Rui Costa Reis e Carlos Santos farejam dinheiro ao longe. É uma qualidade que não se lhes pode recusar. Assim, em 2014, viram uma oportunidade de se desfazer da fábrica antes que ela virasse sucata de todo, amealhando uns bons trocados – na verdade, uns bons milhões de dólares.


Após negociações com Abdul Hamid Assi, representante de um empresário libanês nascido em Kinshasa, Jaafar Lakkis, patrão da Better African Foods (BAF), no dia 12 de Fevereiro desse ano, Reis e Santos celebraram um memorando de entendimento no âmbito do qual prometeram vender, e aqueles comprar, a totalidade das acções da Kikolo-Sociedade Industrial de Moagens, pelo montante global de 14 milhões de dólares. Os dois «farináceos» fecharam igualmente o negócio em representação de outros accionistas minoritários, designadamente a Intercomercial-Moagens, a Azul Marinho SA e a Camomila SA, duas pequenas imobiliárias.


Na sequência dos entendimentos celebrados, a Better African Foods realizou os primeiros pagamentos em duas tranches: uma para Rui Costa Reis, no valor de USD 1.978.372 e outra para o seu sócio, Carlos Santos, no montante de USD 1.177.199, totalizando USD 3.155.572.


Não obstante estes pagamentos, apenas a 11 de Outubro de 2016 ficou lavrado entre as partes um contrato definitivo, que reajustou o acordo celebrado dois anos antes. Assim, ficou estabelecida a compra por Jaafar Lakkis de um total de 67,86% das acções da sociedade, pelo valor de USD 10 milhões, aceitando as partes como válidos os montantes já pagos anteriormente.


Paralelamente, firmou-se um contrato-promessa de compra e venda de mais 27,13% de acções, ao preço de cerca de USD 4 milhões, tendo a parte compradora a prerrogativa de fazer a sua liquidação em 2.400 dias contados a partir daquela data. Os dois pacotes de acções totalizariam USD 14 milhões e com eles os árabes passariam a deter 95% do capital da sociedade.


O que aconteceu depois? De acordo com mapa de pagamentos a que o Correio Angolense acedeu, em pouco mais de um mês, a Better Foods tratou de honrar o compromisso realizando vários desembolsos que, até final de Novembro, totalizaram USD 10.044.326, ficando praticamente quitado o primeiro conjunto de acções, garantindo aos árabes posição maioritária na sociedade. Nos quatro anos seguintes saldou-se a dívida remanescente. No dia 02 de Junho de 2020, Rui Costa Reis e Carlos receberam, respectivamente, USD 1.800.000 e USD 2.200.000, como contrapartida da venda das suas acções pessoais e em representação dos demais accionistas, Intercomercial Moagens e as sociedades imobiliárias Azul Marinho e Camomila.


Em termos globais foram pagos, para além dos USD 14 milhões, mais USD 1.358.326 correspondentes a juros de mora, totalizando USD 15. 358.326.


Entretanto, nesses 4 anos, em simultâneo com o pagamento da dívida, a Better Foods foi realizando avultados investimentos para modernizar e tornar novamente operacional a fábrica Moagem do Kikolo, situada nas cercanias do Cemitério da Mulemba, em Luanda, até que ela voltou novamente a operar.


 


MEIO-CAMPO AOS ÁRABES


Mas foi a partir daí que sobreveio um autêntico «31 de Janeiro» para os árabes. Quando eles julgavam que estando paga a dívida seria só somar, começou o pesadelo provocado pelos dois irascíveis farináceos, que fizeram manguito aos árabes e pretendem reapossar-se da empresa.


Os «farináceos» deram um verdadeiro meio-campo aos compradores. Foi mesmo assim sem tirar nem pôr. No dia 2 de Junho, depois de feitas as últimas transferências para as contas bancárias tituladas por Rui Costa Reis e Carlos Santos, Abdul Hamid Assi, o representante de Jaafar Lakkis no negócio, procurou contactá-los por meio dos endereços convencionados para o efeito, a fim de que estes emitissem as respectivas declarações de quitação e agendassem uma data para a celebração do contrato definitivo das acções prometidas, incluindo o direito e obrigações inerentes à posse de tais acções. Como não obteve resposta, fez uma segunda tentativa e, novamente, um irritante «chama-cha mapinduzi».


Face a silêncio tão tumular, o italo-libanês começou a ficar preocupado. Se fosse angolano teria soltado um sonoro e angolaníssimo «jêdemais». E o caso não era para menos. O comportamento dos «farináceos» era simplesmente incompreensível e sem o menor fundamento, uma vez que a outra parte tinha cumprido todas as obrigações contratuais. Só lá mais para a frente, já com o documento em mãos lavrado por ele próprio com os termos de quitação, Abdul Hamid conseguiu ter um encontro pessoal com Rui Costa Reis. Mas este recusou-se a rubricá-lo alegando não ser necessário.


Os novos donos da Moagem do Kikolo asseguram ainda terem enviado uma carta electrónica, com idêntico resultado. Ficava mais do que evidente para eles que Rui Costa Reis e Carlos Santos estavam a esquivá-los com o claro fito de não celebrarem os actos finais por via dos quais a empresa mudaria definitivamente de mãos. E se essa era a intenção, faziam-no dolosamente e de má-fé.


As suspeitas se concretizaram ainda em Dezembro de 2020, quando Rui Costa Reis e Carlos Santos, agora já sem quaisquer disfarces, trataram de promover uma assembleia-geral de trabalhadores da empresa, que a contraparte árabe considera ilegal, por não ter sido convocada nos termos legais e por ter sido presidida por quem não tinha legitimidade para fazê-lo. No referido evento, sem meias-palavras, os «farináceos» se arrogaram detentores novamente da totalidade das acções da empresa, apesar de já terem vendido 95% delas, dizendo que o faziam em virtude de se terem verificado supostas irregularidades e falta de transparência na gestão da mesma pelos árabes.


Mais: antes, já na manhã do dia 17 de Dezembro, num acto de força, Rui Costa Reis e Carlos Santos estiveram nas instalações fabris, pretendendo impor uma nova administração, a deles obviamente, intentos que foram frustrados pela segurança das instalações e pela polícia entretanto chamada ao local.


A Better African Foods tratou de mover uma providência cautelar para anulação da que considera ter sido uma assembleia ilegal, em simultâneo com uma acção criminal contra os «farináceos» e pares. Ambos os actos correm trâmites nas instituições judiciais angolanas.


Os libaneses estão agora convencidos que o que os «farináceos» pretendiam, eventualmente desde a primeira hora, não era um negócio limpo. Mas a (re)tomada de assalto da firma assim que ela fosse novamente viabilizada fruto dos avultados investimentos que foram feitos. Garantem que Rui Costa Reis, Carlos Santos e pares, que receberam o que lhes era devido, há de 12 anos que não interferiam na administração. Só se moveram depois do termo da dívida e, finalmente, terem visto a fábrica passar de ruínas para uma unidade de produção novamente.


Enfim, trata-se de caso para dizer que a Better African Foods caiu no conto do vigário. Ou melhor… caiu na lábia de dois «farináceos» que no passado já deram o que falar quanto a negócios ilícitos e outras tropelias.


Correio Angolense 



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