O combate político-partidário no País e o como a UNITA diversificaria a economia se chegasse ao poder despontam entre as questões afloradas pelo secretário provincial do «Galo Negro» em Benguela. Em entrevista ao Novo Jornal, Adriano Sapinãla acusa o partido no poder de «manipulações» de votos, critica o fraco investimento no campo e questiona por que razão o Presidente da República prometeu 500 mil empregos «se sabia que não o iria conseguir».
Luís Nunes, seu homólogo do MPLA, já avisou que a meta nas próximas eleições é dar «5-0» à oposição, ficando com os cinco deputados do círculo de Benguela…
Olha, até pode ser engraçado, partindo do princípio de que ele [Luís Nunes] dá sinais de que não conhece a praça que está a liderar. Aqui, está em Benguela, já não está na Huíla e, por conta disso, vai ter de fazer algum estudo sobre Benguela e sobre a força da UNITA nessa província. Claramente que é miragem pensar que a UNITA aqui vai obter, outra vez, o resultado de 2008 (5-0). O nosso desafio é ir atrás dos resultados de 1992, em que, sim, a UNITA deu 4-1 em Benguela. Então, esta perspectiva de [o MPLA] dar 5-0 à UNITA é um sonho, primeiro. Em segundo lugar, política é mesmo uma ciência e, por conta disso, não se pode fazer com emoções, fanatismo, etc. É preciso ter aqui elementos palpáveis da ciência política para se fazer estratégias políticas.
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Por que diz isso?
Qual é o índice de aceitação do MPLA, hoje, nas populações? É completamente baixo, partindo do pressuposto de que as suas políticas públicas têm estado a falhar constantemente. E, para nós aqui, em Benguela, há uma espécie de um grande kilápi, que é a promessa de transformar Benguela em Califórnia. Obviamente, isso vai pesar na balança para avaliar a governação do MPLA, em 2022. Este é um aspecto. Outro aspecto: a cesta básica está completamente elevada, ante o degradar e o desvalorizar da força do Kwanza no mercado nacional. Então, com uma cesta básica altíssima – tenho aqui um estudo comparado do Ministério das Finanças, que avalia a cesta básica actualmente acima de 250 mil kwanzas, num País em que o salário mínimo ronda os 30 mil -, como é possível, diante destes factos, que alguém se arrogue em ter vitórias nessas proporções? Aliás, o risco que o MPLA corre, neste momento, é de perder as eleições. Este é o facto.
E como é que está a UNITA?
A UNITA está em força, com uma liderança que todos os dias galvaniza mais eleitorado para o partido. E repara: não estamos a falar de militantes, estamos a falar de eleitores, porque, neste preciso momento, o nosso desafio não é encher a base de dados com X militantes, não! Nós temos mesmo que trazer o País para a lógica da transparência, porque se sabe que nem todos os militantes votam para os seus partidos, e é normal em democracia. Então, o nosso foco é o eleitor. Na perspectiva de irmos atrás do eleitor, estamos a trabalhar com todos os extractos da sociedade da província de Benguela na busca destas simpatias. Aliás, há sinais muito claros que demonstram a ascensão da UNITA no que diz respeito à aceitação da população.
Se é verdade que a UNITA vai aproveitar as falhas da governação do MPLA, também não é menos verdade que precisará de mostrar soluções. O vosso partido é acusado de nunca apresentar propostas para o País…
Isso também é mera propaganda. A UNITA nasce na base de um programa, e este denominou-se Projecto de Muangai. Esse projecto é tão actual que, até hoje, o MPLA tenta vir ao encontro deste projecto da UNITA, e eu vou explicar. Isto vem logo na génese da UNITA. Quando quisermos olhar para a perspectiva 74/75, vamos entender que o programa que mais cativou os angolanos – é só falar com os mais velhos que lhe vão dizer – é o programa da UNITA. Quando vamos para 1992, o programa que mais deu aquele folclore todo ao cenário político foi o da UNITA. Em 2008, 2012 e 2017, idem. Então, é uma propaganda vir dizer que a UNITA não tem nenhum programa. Não é verdade! O partido tem um programa claro para o País e, aliás, desde a sua nascença e, na base disso, tem estado a posicionar-se e diz-se que o MPLA tem estado a vir um pouco em direcção ao programa da UNITA. O MPLA, depois da independência, defendeu o partido único e implantou-o. A UNITA resistiu, através de um combate revolucionário, e, depois, trouxe a democracia ao País. Hoje, o MPLA abraçou a democracia, mas, por ser um partido de matriz comunista, está com dificuldades de se adaptar à democracia. Então, esta conquista é da UNITA.
Em termos económicos, que exemplo pode dar sobre a suposta aproximação?
A questão da economia de mercado é ideia da UNITA. O MPLA defendia a economia centralizada. Hoje, em Angola, temos a economia centralizada ou economia de mercado? Obviamente, temos a economia de mercado. É um pouco de distracção, inclusive, para aqueles que dão espaço à ideia de que a UNITA não tem programa, porque há aqui exemplos claros. E, hoje por hoje – vamos olhar para uma perspectiva de analisar o País e aquilo que tem sido a prática do MPLA na governação e, do outro lado, as promessas que ele traz na fase das eleições – vamos logo entender que as promessas do MPLA não são exequíveis por causa mesmo deste contra-senso.
O MPLA está apostado na diversificação económica…
Não se vai diversificar a economia se não se apostar no campo. Estão a falar de diversificação, mas completamente agarrados ao petróleo. Você não vai diversificar tendo apenas um único produto como a base da tua economia. O princípio no Muangai diz, na busca de soluções económicas, “priorizar o campo para beneficiar a cidade”. Repara o quão logicamente é realista este princípio na busca de soluções económicas. Hoje, as pessoas vão atrás das cidades para tentar buscar soluções, porque o campo não tem nada. Mas, se houvesse algum investimento a nível do campo para poder também atrair as pessoas a não irem atrás das cidades permanentemente, claramente que teríamos aqui uma economia mais sustentável, porque a produção partiria do campo. Você não pode descurar a agricultura. Andámos aqui com a mania de grandes patrões, donos de tudo e mais alguma coisa, fizemos coisas espetaculares, promessas, metros de superfície, fibras ópticas, satélites e tudo isso, mas você nem energia eléctrica consegue dar ao cidadão. Como é que você vai querer industrializar e potenciar se o básico você não fornece? Estamos a falar de água potável, de energia eléctrica, de serviços de saúde e educação. Cá, em Benguela, há ainda crianças a estudarem debaixo das árvores. Com é que você quer alavancar o País com uma base inexistente? Estamos aqui a construir um castelo de areia que não tem sustentabilidade.
Se a UNITA, ao longo dos anos, sempre apresentou supostamente os melhores programas de governação, por que razão não está no poder?
Socorro-me de uma frase do presidente Adalberto Costa Júnior: “O MPLA é um projecto de poder e a UNITA é um projecto de sociedade”. O MPLA agarrou-se ao poder e passou a ideia de que é o único partido que pode governar, inclusive vem com a ideia de que nasceram para governar e os outros só estão aí para bater palmas. Tudo isso é um mito. Tenho estado a dizer que precisamos de desintoxicar as mentes dos angolanos na perspectiva do bem, que é a alternância política, porque, olhando para todas as questões que já se passaram, o que o País precisa é a alternância.
Por que defende isto?
Defendo isso porque a alternância traz competitividade à governação. Repare: se a UNITA ganha em 2022, a UNITA não vai ter 47 anos para implementar as suas políticas. Na base da constituição, vai ter cinco anos para implementar as suas políticas, cumprindo com as suas promessas eleitorais e, depois, ganhando a confiança do povo para uma possível reeleição em 2027. Se a UNITA falha em 2022, claramente que vão emergir outras forças, e essas forças podem vir fazer frente ao partido, já que não sei muito bem se o MPLA poderá resistir à oposição. Mas vamos supor que também resista à oposição: MPLA na oposição faz o seu trabalho. Se até lá a UNITA não estiver a ir bem em termos de cumprimento dos seus programas, o MPLA pode aprender com a sua passagem na oposição para criar a ideia duma Angola real, porque um dos problemas que temos é que o MPLA vende uma ideia fictícia de Angola, quando, na realidade, o País é outro; vende uma Angola “cor-de-rosa”, onde tudo está bem. Você nunca vai ouvir um militante do MPLA dizer que está mal, mas também não há energia nem água na sua casa; não tem nada. O salário dele não cobre as despesas mensais, mas ele diz mesmo que “o País está bom”. Nesta perspectiva, a alternância traz competitividade, porque, quando a UNITA estiver a governar, saberá que tem de satisfazer as necessidades do povo, senão o povo já não vai votar nela. Há um outro ganho com a alternância, que é a devolução do poder ao soberano povo angolano, porque, afinal, o poder é do povo, mas, infelizmente, o povo depois é manietado. Todo o mundo sabe que o MPLA tem estado a ganhar as eleições na base das manipulações. E eu digo: em 1992, a UNITA falou de fraude, foi mal vista, até no cômputo internacional. Em 2008, outra vez; em 2012, já com algumas reticências; em 2017, era o povo que estava a dizer: “UNITA, não tome posse na Assembleia porque nós votámos em vocês”. É o povo que começou a dizer que houve fraudes.
Em 2017, a UNITA falou tanto de uma suposta contagem paralela de votos que nunca chegou a divulgar…
Porque também foi bloqueada.
Como assim?
Os delegados de lista não tiveram acesso às actas de operações eleitorais. Quando falamos de actas de operações eleitorais, estamos a falar daquelas actas que devem nascer da contagem nas assembleias de voto. Depois da contagem, é elaborada a acta de operação eleitoral e aquela acta, sim, é que vai dar o resultado. Qual é o sistema de contagem em Angola? Aquelas actas são escoltadas pela Polícia até à sede da Comissão Municipal Eleitoral. Daqui, diz-se que mandam os resultados para Luanda, e de Luanda vêm por fax os resultados para ditar aquilo que foi a produção nos municípios. Obviamente, Luanda não pode fornecer os resultados dos municípios, pois o sentido está invertido. Têm de ser os municípios a lançar para a província e das províncias para Luanda. O que acontece é que as comissões provinciais eleitorais são meramente decorativas. Se o processo parte do município para Luanda para depois Luanda mandar os resultados por fax para as comissões provinciais eleitorais, não há escrutínio provincial.
Conhecendo já esta realidade, o que o partido está a fazer para em 2022 as coisas serem diferentes?
A UNITA está a propor a revisão da Lei eleitoral e, neste aspecto, claro, há alguma resistência por parte do MPLA. Aliás, vamos ver exemplo do presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), o senhor Manico. Como sabem, a UNITA e outros partidos na oposição votaram contra a sua indicação para presidente da CNE.
Porquê?
Primeiro, já fez todos os mandatos que a CNE prevê. Segundo, tem processos que envolvem, inclusive, desvio de fundos e de bens materiais da Comissão Provincial Eleitoral de Luanda, de que ele era o presidente. Só por isso, se estamos a falar de combate à corrupção, o senhor Manico já não poderia ser o presidente da CNE. Qual é o interesse que o MPLA tem de insistir, mesmo nessas condições, que ele seja o presidente da CNE? Também há aqui um indício claro de que, outra vez, o MPLA está de má-fé…
Faltando pouco mais de um ano para as eleições, acredita que se vá a tempo de se rever a Lei Eleitoral?
Vai-se a tempo. Se quisermos fazer recurso à história, Luzia Inglês foi retirada da CNE em pleno 2012, pouco antes das eleições.
Qual é o plano B da UNITA, caso a pretendida revisão da Lei Eleitoral não ocorra?
Obviamente, não vou poder responder a esta pergunta, porque estaria a expor uma estratégia. Toda a estratégia exposta antes do tempo falha, porque o nosso adversário também se vai preparar para contê-la. Mas, que existe plano B, existe, sim.
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