O QUE HOUVE A 7 DE MARÇO DE 2011?- NUNO ÁLVARO DALA



Quero, por introito, esclarecer previamente que eu não fiz parte do pequeno grupo de jovens que, na madrugada de 7 de Março de 2011, dirigiram-se e posicionaram-se no Largo da Independência para procederem ao acto fundacional  de luta que visava a queda do regime de José Eduardo do Santos, porquanto, nas palavras de Agostinho Jonas Roberto dos Santos (nome fictício), em entrevista ao site Terra Magazine, a 23 de Fevereiro de 2011, a juventude – em particular – estava cansada de uma «ditadura de quase 32 anos».


Na verdade, eu passei pelo Largo da Independência por volta das 11h00 do mesmo dia, mas, para além de que o espaço estava tomado por um pesado cordão de segurança policial, obviamente, não havia manifestação nenhuma. O pequeno número de jovens que chegara e ficara por algumas horas no largo, desde à madrugada, viu a programada manifestação abortada. Por outro lado, não me dirigi ao Largo da Independência para participar da manifestação, pois, meu objectivo era assistir ao cenário e tirar conclusões. Aliás, nem sequer pus os pés no largo propriamente dito, antes, pelo contrário, circulei pelo entorno por cerca de uma hora até que, tomado por um misto de vazio e frustração, regressei para casa. Na altura, eu vivia no Bairro Grafanil, e tinha acabado de retomar a parte política do meu activismo (que começara na forma de activismo comunitário, em 2000, mas de que excluí a parte política por, em 2003, eu ter-me tornado Testemunha de Jeová, sendo que, até 2010, meu activismo passara a ser essencialmente social, caracterizado pelas linhas de intervenção em Direitos das Pessoas com Deficiência, Educação e Emancipação de Pessoas Surdas e com Deficiência Auditiva, Tecnologias Assistivas, Assessoria Técnica a ONGs diversas, locais e estrangeiras etc.).



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Ora, a 7 de Março de 2011 o regime de José Eduardo dos Santos não caiu. 


Entretanto, naquela data ocorreram factos como os seguintes:


1. A dúzia de jovens que madrugou para fazer o seu grito por liberdade esteve realmente no Largo da Independência;

2. A tentativa de manifestação foi o acto fundacional, ou seja, em que foi iniciado um movimento de lutas de rua virado ao combate à ditadura de José Eduardo dos Santos e seu MPLA;

3. O acto marcou a emergência de uma franja contestatária da juventude angolana, que decidiu, a despeito dos riscos, incluindo o da morte, empreender uma jornada que entendia imperativa tanto à luz da História e do tempo como à luz de princípios tais como o Interesse Nacional e o Estado democrático de direito.


Depois de 7 de Março de 2011, várias manifestações e tentativas de manifestações tiveram em lugar em Luanda. A primeira vez que estive numa manifestação foi a 2 de Abril de 2011, no Largo da Independência, onde, cerca de 300 jovens realizaram a Manifestação pela Liberdade de Expressão. Porém, não participei nas demais do mesmo ano nem do seguinte, sendo que apenas voltei a participar duma em 2013 (eu passara a viajar bastante por razões de formação e não só). 


Com o transcorrer dos anos, o número de jovens manifestantes manteve-se reduzido por diversas razões, sendo uma das principais as violentíssimas repressões (levadas a cabo pela Polícia Nacional e por milícias), sobretudo no período 2011-2014, embora, a partir de 2013, a Polícia tivesse passado a usar a táctica de prender os manifestantes e levá-los aos arrabaldes de Luanda, onde eram deixados, completamente entregues à sua sorte, tendo havido casos em que foram deixados em províncias como Bengo e Kwanza Norte.


De 2011 a 2015, as manifestações eram literalmente actos perigosos para os que nelas participavam, e o núcleo duro dos revús era bastante exclusivo por razões óbvias. Eu apenas comecei a me aproximar de alguns jovens do referido núcleo no ano de 2013 e um dos primeiros com que passei a interagir é o Mbanza  Hanza , com o qual, fui descobrindo, tinha afinal demasiadas coisas em comum (nascemos na mesma província, fôramos Testemunhas de Jeová, éramos professores etc.). Mas, francamente, nos dois anos anteriores, nunca tive interesse em interagir, nem mesmo via Facebook, algo que passei apenas a fazer em 2013, como disse acima, sendo que também concorriam outras razões, tais como o facto de eu manter uma postura de sem-grupo e de estar à margem dos grupos, bem como as suspeitas, embora poucas, quanto a se realmente estavam a fazer as lutas sem coberturas de interesses e agendas externos. As infiltrações também me incomodavam. Somente em 2014 é que me vi a interagir com a maior parte dos rapazes do núcleo duro.


Todavia, as reuniões das principais figuras da revuada já em 2013-2014 – sobretudo no bunker (na Vila Alice) - reflectiam sobre a necessidade de o movimento iniciado em 2011 fazer inflexões evolutivas. Surgiram correntes divergentes, e duas se tornaram eminentes: uma defendia que era necessário que os revús se organizassem, que tivessem uma estrutura organizacional que, como plataforma, seria útil aos jovens para a salvaguarda segura do capital político conseguido desde 7 de Março de 2011 e para viabilizar de forma organizada a articulação com os outros entes da esfera pública, tais como os partidos políticos, entres outros. A outra corrente defendia que era melhor que o movimento se mantivesse sem organização nem estrutura definida e muito menos burocracia, sendo que o movimento se contrairia e se atrofiaria segundo seus diversos efluxos e influxos de dinâmica política e social.


Basicamente, as duas correntes podem ser denominadas como organizacionista (formalista) e inorganizacionista (não organizacionista ou informalista).


Os revús organizacionistas criaram o Movimento Revolucionário (MR, e destaco aqui o Adolfo Campos, o Pedrowski Teca,  o Raúl Mandela, o Albano Bingo Bingo, o Arante Kivuvu, o Nito Alves, apenas para exemplificar) e outros criaram o Movimento Revolucionário de Angola (MORANGO, e destaco aqui o Osvaldo Caholo).


Os revús não-organizacionistas simplesmente continuaram a fazer uma luta em moldes não estruturados. Em todo o caso, pode-se dizer que fizeram algumas concessões, pois, passaram a valorizar a cobertura sistemática dos actos cívicos (manifestações, marchas, reuniões etc.) dos revús. Criaram o blogue Central Angola 7311. Com o tempo passaram a ser designados como centraleiros, a saber, o Emanuel Piitra, o Mbanza Hanza, o Carbono Casimiro (de feliz memória), o Nelson Dibango, o Abraão Chissanga, o Hitler Jessy Tschikonde, o Luaty Bierão, o José Gomes Hata, o Bitão Felisberto Holua e outros.


Evidentemente, no meu caso, só soube que estava entre os centraleiros já depois de me enturmar com os mesmos, embora eu tivesse fortes objecções ao inorganizacionismo da luta.


Pode-se concluir com segurança que os que vieram a ser os célebres 15+2 eram centraleiros (os não organizacionistas), com excepção do Nito Alves, do Albano Bingo Bingo e do Osvaldo Caholo.


Ora, este texto já vai demasiado longo, e deve ser lido como um rascunho meu, porquanto sou demasiado perfeccionista para estar satisfeito com o mesmo, pelo que, para não cansar os leitores, encerro-o aqui, mas não sem antes deixar plasmado que é preciso que seja construída a devida memória, a qual é fundamental para a historiação e historicização dos revús e suas lutas. 


Sim, 32 era muito. E 45 é muito.


NOTA: Na foto estão os jovens que madrugaram a 7 de Março de 2011.



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