Angola entre o petróleo e a dívida



A análise de Jaime Nogueira Pinto à economia angolana e aos desafios que enfrenta em contexto de pandemia e após a crise.


Com pouco mais de 20 mil casos registados e cerca de 500 mortes, numa população de 33 milhões de habitantes, pode dizer-se que, em Angola, a pandemia tem tido sobretudo uma incidência indirecta, com repercussões económico-sociais essencialmente ligadas à quebra da produção e do preço do petróleo.


A diversificação da economia, que se podia ter iniciado nos anos seguintes ao fim da guerra civil, quando havia paz e recursos, está ainda por fazer; e, embora haja hoje um reconhecimento geral da sua prioridade, há também a consciência de que o processo de reconversão precisa de investimento e de tempo, até porque é na Agricultura que está a prioridade, não só para diminuir as importações, mas para criar emprego numa população activa que cresce todos os anos. O petróleo irá por isso dominar por muitos anos a economia angolana.



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Ora no segundo trimestre de 2020, com a contracção da economia mundial, o Brent - que representa 95% das exportações e 55% das receitas fiscais angolanas - atingiu valores negativos (-37 dólares o barril). O preço médio ficou depois pelos 42,4 dólares e foram exportados 473 milhões de barris, mas as receitas não chegaram a um terço das obtidas em 2019. A produção baixou significativamente também pela redução das quotas de produção da OPEP (1 290 000 barris/dia contra os 1 800 000 dos anos de ouro da década anterior).



A diferença entre o custo de produção e o preço de venda do barril não é fácil de estabelecer no caso de Angola, dada a diversidade do custo de exploração nos diversos blocos. Em Cabinda, por exemplo, ou no offshore abaixo dos 800 metros, o custo é muito mais baixo do que nos empreendimentos deep-offshore ou ultra-deep-offshore; e com a pandemia a exploração encareceu significativamente.



Mesmo assim, graças à legislação de 2018, as grandes empresas do sector, como as europeias Total e ENI, retomaram o investimento em Angola. A Total iniciou em Julho de 2018 um projecto no ultra-deep-offshore do Koambo (a 1950 metros de profundidade), destinado a produzir 230 mil barris/dia. A empresa francesa continua a ser a principal operadora estrangeira no país e o governo autorizou recentemente a Qatar Petroleum a tomar uma posição de 30% no Bloco 48 (adquirindo 10% à Total e 20% à Sonangol).



Com a retoma da actividade económica observada, especialmente na Ásia, a projecção da US Energy Information Administration é para um preço médio de 56 dólares/barril para o primeiro trimestre de 2021, com uma descida para 52 no resto do ano, dado o gradual aumento da produção. Avaliando o custo de produção por barril entre 25 e 30 dólares, há aqui uma boa margem.


Angola espera também reequilibrar a balança energética, agravada pela importação de produtos refinados, com a construção de uma refinaria em Malembo, Cabinda, com uma capacidade de refinação final de 60 mil barris diários. Também o esforço de redução das importações de produtos alimentares, outra factura que choca num país com as condições naturais de Angola, parece ter dado alguns resultados em 2020.



Se é verdade que 2020 foi o annus horribilis para Angola e para o mundo atacado pela pandemia, é também certo que a quebra dos preços do petróleo vinha já a afectar as contas angolanas desde 2014, devido a anos de falta de investimento em novas explorações e à redução das quotas de produção pela OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo).



Assim, segundo os últimos números do INE, a quebra acumulada do PIB angolano entre 2015 e 2019 foi de 5%. E em 2020, com a covid-19, deverá agravar-se em mais 5%, ou seja, para um acumulado de 10%. Houve, no entanto, um esforço dos responsáveis do sector financeiro que, apesar deste quadro, conseguiram superavits em 2018 e 2019; e em 2020 o défice deve ficara abaixo dos 2%.



Ao ser eleito presidente, em Setembro de 2017, João Lourenço iniciou uma campanha de moralização da vida económica e social, com medidas anticorrupção que atingiram personalidades e famílias até aí consideradas "intocáveis" e compreendeu também que era preciso melhorar as condições de vida das populações, e depressa. No entanto, além das quebras constantes da receita petrolífera, que apanharam em cheio o início da sua presidência, houve uma depreciação muito acelerada do kwanza, com a consequente subida de preços no consumidor de produtos essenciais, como os produtos alimentares, que dependem de importações.



A crise do petróleo e a subida da dívida


A outra grande componente da equação angolana é a dívida pública, nos seus valores absolutos e na sua relação percentual com o PIB. Grosso modo, dois terços dessa dívida é externa e um terço interna.


A dívida externa governamental está muito concentrada num credor: o Estado chinês e os bancos chineses. E isto também por uma razão histórica: quando a guerra acabou, o Ocidente - Estados Unidos e Europa - não mostrou muita atenção ou interesse em financiar e investir em Angola. Pelo contrário, a República Popular da China, que estava a iniciar a sua corrida a África, numa política de aquisição de produtos energéticos e mineiros e de financiamento a troco de obras públicas para as suas empresas de construção, chegou em força.


A dívida externa pública angolana, entre 2010 e 2014 (ano da quebra do preço do petróleo), manteve-se numa média ponderada de 33% do PIB. Mas em 2015 começou a disparar para 60% e em 2016 para 75%, com os grandes empréstimos chineses. Em 2018, primeiro ano da presidência de João Lourenço, estava em 86%. Passou-se de cerca de 36 mil milhões de dólares em 2015 para 44,5 mil milhões em 2018. Segundo os números da Trading Economics, no fim de 2020 a dívida externa estava em 48,8 mil milhões. E estes valores da dívida do Estado não incluem a dívida externa das empresas públicas Sonangol e TAAG, que anda pelos 5,5 mil milhões. A esta deverá somar-se ainda a dívida interna, que rondará os 20 mil milhões de dólares.


O grande credor de Angola, com 22 mil milhões de dólares (43% do total da dívida externa) é a República Popular da China e segundo maior é o Reino Unido, com cerca de 14 mil milhões de dólares (27% do total), incluindo dívida titulada em eurobonds registados no Reino Unido mas não pertencente a investidores britânicos; vêm depois organizações internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, e uma lista de países, por esta ordem: Israel, Irlanda, Portugal, Espanha, Japão, Estados Unidos, França e África do Sul. A dívida a Portugal é de 900 milhões de dólares (1,7% da dívida externa angolana).


Fonte: Dinheiro Vivo 



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