Se houver dinheiro levado de forma ilícita ao Brasil será devolvido à Angola- diz embaixador brasileiro em Angola



O Embaixador do Brasil em Angola, Paulino Franco de Carvalho Neto, afirma que os dois países tiveram sempre uma cooperação econômica muito proveitosa. Em Entrevista ao Jornal de Angola, o diplomata brasileiro destaca que “os recursos de bancos públicos brasileiros que vieram para Angola foram, de modo geral, muito bem utilizados e aproveitados”.


Acrescenta que a nação africana foi fiel cumpridora dos seus deveres e que nunca atrasou pagamento algum. “A cooperação entre o Brasil e Angola, no domínio financeiro, é exemplar. Queremos continuar em novas bases esse tipo de cooperação, com ênfase para investimentos directos”


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Angola é um tradicional parceiro comercial do Brasil em África e importante destino de investimentos brasileiros desde fins da década de 1970. Vivemos hoje um momento de retomada das nossas relações económicas e comerciais, após período de relativa desaceleração por causa de crise económica que atingiu os dois países.


A Embaixada procura continuamente aproximar, não apenas os governos do Brasil e Angola, mas também o sector privado, ajudando a identificar oportunidades e promovendo o estreitamento dos laços interpessoais dos dois lados do Atlântico. As reformas promovidas pelo Presidente João Lourenço, no sentido de melhorar o ambiente de negócios, reforçando a transparência e a segurança jurídica para investidores estrangeiros, são muito parecidas com as que se fazem no Brasil. São reformas que também aproximam Angola da agenda económica do Governo do Presidente Bolsonaro, dando prioridade à responsabilidade fiscal, à redução do peso do Estado e da burocracia e ao combate à corrupção. É preciso intensificar a divulgação desta nova Angola junto ao empresariado do Brasil. Trabalhamos em coordenação com o Governo angolano para facilitar iniciativas neste sentido.


Qual é o volume de negócios entre os dois países?


Em 2019, as exportações brasileiras para Angola somaram 441,5 milhões de dólares e as importações 140,5 milhões, perfazendo uma corrente de comércio de 582 milhões. São números que continuam a ser expressivos e garantem ao Brasil lugar de destaque entre os principais parceiros de Angola. O volume de comércio entre Brasil e Angola chegou a registar 4 biliões de dólares em 2018, mas, assim como o comércio exterior de Angola com o resto do mundo, tem sofrido considerável queda desde 2015. Em função da crise económica, as trocas com o Brasil também reduziram. Um exemplo significativo do incremento recente do nosso comércio é que, no último ano, o Brasil foi o primeiro destino de exportação de gás liquefeito de Angola, LNG, no Soyo, e o país continua a importar o produto de Angola. Do lado das importações angolanas, a maior parte dos produtos destinados a Angola são agrícolas (cerca de 80,42% do valor total).


No que diz respeito aos investimentos, embora não se disponha de dados estatísticos precisos, sabe-se que muitas empresas brasileiras investiram em Angola para prestar serviços associados a projectos de infra-estrutura do passado. Hoje, assistimos ao inicio de uma nova era, em que empresários demonstram interesse em actuar em novos sectores. É sinal de que muitos brasileiros já se aperceberam destas novas oportunidades. São vários projectos de investimentos que poderão ser iniciados ainda este ano, como, por exemplo, o empreendimento pioneiro em Angola no sector da indústria farmacêutica, que está a ser analisado pelas autoridades angolanas competentes, para aprovação. Além desse, há projectos iniciados há alguns anos, no período anterior à crise, que continuam a avançar, como a siderurgia do Cuchi, do grupo brasileiro Modulax, e a usina de etanol da Biocom.


No ano passado, durante a visita a Angola do ministro das Relações Exteriores do Brasil, foi assinado, em Luanda, um acordo no domínio da Segurança e Ordem Interna. Como está a ser implementado o acordo?


A avaliação sobre a implementação do referido acordo constitui um dos tópicos a serem tratados no âmbito da visita ao Brasil do ministro das Relações Exteriores, Ma-nuel Augusto. Em princípio e sujeito ainda a pareceres jurídicos definitivos, parece que o instrumento terá entrado em vigor a partir do momento da assinatura, em Dezembro, não devendo necessitar de passar por outros trâmites, na medida em que os compromissos nele plasmados não gerariam ónus específicos, o que é um dos requisitos no Brasil para a aprovação parlamentar.


Conforme estabelece o artigo 10 do acordo, a implementação e coordenação estarão a cargo, pelo lado angolano, do Ministério do Interior; e pela parte brasileira, do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O artigo 12 do acordo prevê a reunião anual, de forma alternada, do Grupo Técnico Bilateral, incumbido do desenvolvimento, avaliação e acompanhamento da cooperação prevista, sem prejuízo de reuniões extraordinárias. Espera-se, para breve, a marcação da primeira reunião.


Convém assinalar que o acordo não se limita à mera troca de informações, contemplando, ainda, formação e capacitação de quadros, fornecimento de equipamentos, gestão de serviços de investigação criminal, desenvolvimento de sistemas de dados, entre outros aspectos em que o Brasil tem condições de colaborar de maneira específica.


Na sua passagem por Luanda, aquando da visita à Índia, o Presidente Jair Bolsonaro disse que ajudaria Angola no combate à corrupção. De que modo seria dada esta ajuda?


Antes de tudo, convém assinalar que, em observância aos princípios da soberania e da não ingerência em assuntos internos de outros países, os quais regem as relações internacionais, eventuais pedidos de cooperação em matéria de combate à corrupção precisam de ser formulados expressamente pela parte interessada. Isso pode dar-se de várias formas e mediante pedidos encaminhados por órgãos dos distintos poderes (executivo, legislativos e judiciário) de cada país.


Assim, por exemplo, caso a PGR em Angola queira solicitar cooperação jurídica do lado brasileiro para troca de informações sobre um inquérito em curso, com potenciais implicações na outra jurisdição, tais como alegadas transacções suspeitas no nosso território, efectuadas por cidadãos angolanos que tenham hipoteticamente expatriado recursos de forma indevida (ou vice-versa), tratar-se-ia de uma modalidade de cooperação a ser levada adiante. Independentemente de existirem ou não acordos bilaterais específicos nessa ou naquela matéria, a colaboração estreita entre instituições angolanas e brasileiras afigura-se uma realidade que ocorre há anos, sendo algo digno de nota, contanto que sempre se respeitem os direitos dos indivíduos e os respectivos ordenamentos jurídicos. Tal parceria regular entre órgãos estatais de lado a lado reflecte a excelência do relacionamento angolano-brasileiro como um todo, fundado na confiança mútua.


Voltando à pergunta anterior, sobre o acordos recém-assinados em matéria de Segurança e Ordem Interna, a primeira reunião do Grupo Técnico Bilateral, destinada à implementação efectiva do instrumento, ganha relevo adicional, à luz da elevada prioridade conferida por ambos os governos, a luta contra a corrupção, uma das modalidades de ilícitos elencadas no artigo 2 para afigurar como objecto de assessoria, assistência técnica e intercâmbio de informações. O acordo pode, portanto, servir de base para a intensificação da cooperação bilateral no combate à corrupção e outros ilícitos que incidam ou perpassem ambos os países.


De todo o modo, as perspectivas de cooperação nessa área são múltiplas e dinâmicas. A isso acresce-se o facto de que as grandes linhas de-fendidas pelo Governo do Presidente João Lourenço encontram ressonância no Governo brasileiro, como no caso do combate à corrupção, circunstância que já se reflecte na nova fase da interacção bilateral, com realce para visitas pioneiras de representantes de instâncias judiciárias e de controlo.


Em Agosto de 2019, uma missão da Inspecção Geral da Administração do Estado (IGAE) esteve em Brasília, tendo os responsáveis reunido com os ministros brasileiros da Justiça e da Controladoria Geral da União. No mesmo mês, a ex-Procuradora-Geral da República do Brasil recebeu uma comitiva chefiada pelo então Vice-Procurador-Geral da República de Angola. Mesmo com a mudança de um e de outro servidor, a cooperação tende a dar frutos, pois criou-se uma dinâmica de intercâmbio. A propósito, o Ministério Público de Angola já manifestou interesse em conhecer melhor o Instituto da “Delação Premiada”, conforme denominado no Brasil. De igual modo, delegações angolana e brasileira tiveram profícuo encontro à margem da 88ª sessão da Assembleia-Geral da Interpol, em Outubro do ano passado.


Portanto, o Brasil está aberto a cooperar com Angola nesta área e no respeito aos princípios de soberania. Caberá às instituições directamente envolvidas, as procuradorias dos dois países fazerem o seu trabalho. Já houve trocas de visita, trocas de informações entre os dois países. Esta cooperação faz-se com base em acordos e entendimentos entre os dois países. Portanto, Brasil e Angola devem intensificar esta cooperação para combater a corrupção.


O ministro das Relações Exteriores de Angola prepara uma viagem ao Brasil (NR: já lá se encontra). Qual é a essência desta deslocação? Está-se já perante os preparativos da visita de João Lourenço ao Brasil?


A visita do ministro Manuel Augusto inscreve-se num contexto mais amplo de retomada do intercâmbio de visitas de alto nível entre o Brasil e Angola e surge em resposta ao convite efectuado pelo chanceler Ernesto Araújo, por ocasião da sua vinda a Luanda, em Dezembro passado. Será mais uma oportunidade para intensificar a cooperação bilateral. A língua comum, os laços culturais e históricos, a “vizinhança atlântica” sempre farão com que as relações entre Brasil e Angola sejam consideradas estratégicas e prioritárias. Além disso, a cooperação e o intercâmbio de experiências realizados ao longo dos anos constituem vantagens comparativas relevantes para estreitar ainda mais os fortes vínculos que nos unem.


Entendemos que, da perspectiva angolana, a visita do ministro Manuel Augusto propicia valiosa oportunidade para promover a imagem da “Nova Angola” no Brasil, em linha com a prioridade que o Governo do Presidente João Lourenço tem atribuído à vertente económica e comercial da diplomacia deste país. Neste sentido, esta visita insere-se nos esforços que vêm sendo realizados pelo Executivo angolano para atrair novos investimentos estrangeiros (neste caso brasileiros), considerados fundamentais para a diversificação da economia e para o sucesso dos programas de privatizações e concessões em curso. Apenas para citar alguns exemplos, os sectores agro-pecuário, de educação, construção civil, infra-estruturas, defesa e saúde possuem enorme potencial para empreendimentos conjuntos.


Respondendo à segunda pergunta, recordo que o Presidente Jair Bolsonaro convidou o Presidente João Lourenço para visitar o Brasil. Neste contexto, um dos objectivos centrais da visita do ministro Manuel Augusto é, sim, preparar a visita do mandatário angolano ao Brasil, a qual esperamos que ocorra proximamente. Durante a sua visita a Brasília, que começa a 2 de Março, o ministro Manuel Augusto deverá discutir com o seu homólogo brasileiro opções de datas para esta viagem presidencial. Recordo que na escala que fez em Luanda, a caminho da Índia, em Janeiro, o Presidente Bolsonaro afirmou que pretende visitar Angola. Estamos a trabalhar para que essa expectativa possa se concretizar por ocasião da Cimeira da CPLP, que se realiza em Setembro, na capital angolana.


O Governo angolano desenvolve uma acção destinada a recuperar os capitais ilícitos domiciliados no exterior. Há muito capital ilícito angolano no Brasil?


Não tenho informações precisas a este respeito. Se houver, tenho a certeza de que, através da cooperação bilateral já mencionada e por meio de outros instrumentos bilaterais, esses recursos serão repatriados, devolvidos a Angola. Não tenho a menor dúvida disso.


Diz-se que há muitos angolanos envolvidos no caso “Lava Jato”. Pode confirmar?


Cabe à Justiça tratar desse assunto. No Brasil, a operação “Lava Jato” continua. São processos longos de busca de elementos de informação para que as pessoas envolvidas se-jam processadas e, se for o caso, condenadas, o que já ocorreu largamente no Brasil. Esta cooperação tem de continuar. Ca-berá à Justiça, de forma soberana, tomar as decisões que julgar acertadas.


Angola pagou a sua dívida ao Brasil e livrou-se das acusações de contas milionárias. Haverá ainda algum pendente sobre esta matéria?


Brasil e Angola sempre tiveram uma cooperação económica muito proveitosa. Os recursos de bancos pú-blicos brasileiros que vieram para Angola foram, de modo geral, muito bem utilizados e aproveitados. Angola sempre foi fiel cumpridora dos seus deveres, nunca atrasou pagamento algum. A cooperação entre o Brasil e Angola no domínio financeiro é exemplar. Queremos continuar em novas bases esse tipo de cooperação, com ênfase em investimentos directos.


Nota-se que os brasileiros es-tão muito bem integrados em Angola. Acontece o mesmo com os angolanos no Brasil? Como está o processo de integração no Brasil? Os angolanos continuam confinados em favelas?


Não, não estão. Os angolanos estão concentrados em algumas localidades, em diversos bairros de algumas cidades, como São Paulo, e eles participam em actividades sociais e económicas do país. Tal como os brasileiros em Angola, eles adaptam-se facilmente ao Brasil, pois os dois países têm muitas semelhanças, história e hábitos comuns. Os angolanos sentem-se em casa, como nós nos sentimos aqui. Muitos vão ao Brasil tentar uma nova vida, conseguir um emprego, que muita vezes aqui não encontram. São bem acolhidos aqueles que vão legalmente, com os vistos adequados.


Há muitos angolanos que tentam entrar ilegalmente no Brasil ou envolvidos em casos de narcotráfico?


Existe dos dois lados, mas é um número muito reduzido. Nós não podemos chamar atenção para a excepção, mas para a regra, para a maioria que age com correcção. De um modo geral, os angolanos que vivem no Brasil são pessoas honestas, trabalhadoras, que se integraram muito bem, tal como os brasileiros em Angola.


Nota-se um certo esfriamento nas relações entre África e o Brasil, depois da chegada do Presidente Bolsonaro ao poder. Não receia que isso possa afectar as economias africanas e brasileira?


Não concordo com essa visão. Para tanto, basta referir a quantidade de actividades que a Embaixada do Brasil em Angola desenvolve e as que a Embaixada de Angola no Brasil realiza, além das visitas de alto nível. Em Dezembro do ano passado, o ministro das Relações Exteriores do Brasil esteve em Angola. Antes disso, tivemos a visita do ministro da Saúde do Brasil, em Novembro de 2019, e a do ministro da Defesa, em Abril passado.


O Presidente Bolsonaro fez questão de fazer uma escala em Luanda no final de Janeiro deste ano, a caminho da Índia, onde realizou visita oficial. Foi muito bem recebido, no aeroporto, pelo ministro das Relações Exteriores, Manuel Augusto, e manteve um telefonema muito cordial com o Presidente João Lourenço, que foi convidado a visitar o Brasil. Tudo isto demonstra que as relações continuam a ser intensas.


Mas reconhece que no passado as relações foram muito mais intensas?


Não reconheço. Foram períodos diferentes, em que a economia angolana andava a um ritmo muito mais acelerado e a economia brasileira também. São períodos distintos, mas a amizade e a cooperação entre os dois países é a mesma.


Não estou a falar das relações com Angola. Estou a falar das relações entre o Brasil e África, de um modo geral.


A exemplo das relações com Angola, as com outros países e regiões de África são muito profícuas. Bastaria mencionar, a título de exemplo, as relações do Brasil com a África do Sul, com a Namíbia, com os países do Norte do continente. São períodos diferentes, épocas diferentes, mas queremos e temos uma presença muito grande em África. Basta dizer que o Brasil é um dos poucos países em desenvolvimento com um número de embaixadas tão grande em África. São 34 embaixadas. Não conheço um outro país em desenvolvimento com esse número de embaixadas.


Normalmente, quando se fala de nepotismo, África aparece nos lugares cimeiros, mas o Presidente Bolsonaro tem filhos em cargos públicos. Não estaremos também perante casos de nepotismo?


Não. Não se trata de nepotismo. Os filhos do Presidente são cidadãos livres, que exercem mandatos públicos, foram eleitos antes do Presidente chegar ao poder. São vereadores, deputados, enfim, é um direito que lhes assiste. Têm a mesma visão política do Presidente, que por acaso é seu pai. Não se trata de nepotismo.


No Brasil, terá havido um outro Chefe de Estado com tantos filhos em cargos públicos?


Não sei dizer, mas nada impede que os filhos do Presidente da República exerçam cargos públicos, exerçam mandatos electivos. Não foram escolhidos pelo Presidente da República, foram ungidos aos seus cargos pelo voto do eleitor. Poderiam não ter sido eleitos, mas o foram.


O Presidente Bolsonaro é acusado muitas vezes, por organizações internacionais rurais e estados do Brasil, de não ter uma política de defesa do ambiente muito efectiva. Que comentário faz sobre estas acusações?


O Presidente Bolsonaro tem dito, reiteradamente, nas suas declarações oficiais, que temos uma política ambiental muito decidida. As políticas públicas ambientais existem há muito tempo, temos um Ministério do Ambiente muito activo, temos uma legislação ambiental moderna. O Brasil, ao contrário de outros países, tem não só uma legislação ambiental muito avançada, mas uma matriz energética altamente renovável, o que o diferencia de muitos outros países, inclusive dos desenvolvidos.


Em outras palavras, a matriz energética brasileira é muito compatível com uma visão de preservação e protecção do ambiente. Sempre tivemos participação activa em fóruns internacionais que se ocupam de temas ambientais. Bastar recordar que o Brasil foi um dos elaboradores do conceito de desenvolvimento sustentável, ou seja, que vai além da protecção do meio ambiente, já que se assenta em três pilares: o ambiental, o social e o económico.


Mas as políticas ambientais não satisfazem as minorias no Brasil. Refiro-me concretamente aos índios.


A meu ver, são queixas equivocadas, baseadas numa visão sectorial, de grupos de interesse, sem dúvida legítimos, mas que não está baseada em factos que as sustentem. Fazem parte do jogo político e muitas dessas minorias defendem interesses de Organizações Não-Governamentais de outros países, com agendas próprias e nem sempre sinceras. Dito de outro modo, tudo isso faz parte da disputa pelo poder económico no plano internacional. Não se trata de uma preocupação ambiental ou de defesa de minorias estrito senso, mas sim de interesse em explorar a riqueza económica da Amazónia.


Programa “Médicos pelo Brasil”


A saída dos médicos cubanos do Brasil afectou, certamente, o sistema de Saúde brasileiro. Como é que o Brasil pretende dar a volta à situação?


O programa “Médicos pelo Brasil”, que substituirá gradativamente o “Mais Médicos”, visa levar melhor serviços de saúde às regiões mais carentes do país, como os municípios menores ou de difícil acesso. Prevê, ainda, a formação a profissionais de saúde, em áreas como a medicina de família e da comunidade. A lei que cria o novo programa foi sancionada em Dezembro passado e prevê 18 mil vagas em todo o país. Trata-se de um aumento de 7 mil vagas em relação ao programa anterior. O primeiro edital para selecção dos profissionais deve ocorrer ainda no primeiro semestre de 2020.


Para priorizar a alocação dos profissionais em municípios mais carentes, a distribuição dos médicos deverá obedecer a critérios definidos segundo metodologia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), baseada em estudos da OCDE, levando em consideração o número da população, densidade demográfica e distância em relação aos grandes centros urbanos.


Ao longo dos dois primeiros anos do programa “Médicos pelo Brasil”, os profissionais realizarão o curso de especialização, recebendo bolsa no valor de 12 mil reais mensais líquidos (cerca de 2.760 dólares), com gratificações adicionais que podem chegar a 6 mil reais (1.380 dólares) para locais remotos, comunidades indígenas, ribeirinhas ou fluviais. Durante a participação no programa, os médicos serão avaliados através de métodos científicos e indicadores de saúde da população, podendo igualmente avaliar a estrutura da unidade de saúde e da rede de serviço do município em que trabalham. No quadro do novo programa, será, também, permitido o regresso de médicos cubanos por até dois anos.


Os cortes no Orçamento para a Educação no Brasil estão a desagradar os sindicatos. Que políticas existem para reverter a situação?


As limitações orçamentais vigentes no Governo Federal decorrem sobretudo do ambiente recessivo verificado no decorrer desta década, situação que felizmente vem sendo superada, de forma paulatina. A conjugação de factores, como o excessivo endividamento do sector público e o aumento “natural” ou inflacionário das despesas, reduziu a capacidade do Governo de investir, deprimindo a actividade económica e frustrando a contrapartida de um aumento na arrecadação de impostos proporcional aos gastos.


Cabe salientar, igualmente, a confusão que por vezes existe entre contenção (ou contingenciamento) de gastos e cortes de orçamento. Quando falamos em contenção, referimo-nos, tão somente, ao eventual atraso de parte dos desembolsos referentes a verbas discriminatórias, ou seja, as não-obrigatórias, de modo que não se corra o risco de incorrer em gastos superiores ao orçamento previsto. Mesmo em situação de contenção, cada órgão do Governo deve executar, até ao final de cada ano, a totalidade da alocação orçamental. Esta óptica foi a que pautou o Ministério da Educação, não apenas desde o início do actual Governo, mas também em anos precedentes.


O Brasil conta com dispositivos constitucionais para travar o avanço de desequilíbrio no orçamento público, sendo os mais significativos a chamada “regra de ouro”, que impede a contratação de novas dívidas para o pagamento de despesas correntes e o “tecto de gastos”, que limita a cada sector da administração pública o nível de gastos.


Por tratamento especial, refiro-me ao facto de que, em 2017, primeiro ano de vigência do “tecto de gastos”, o cálculo do orçamento da Educação não se deu com base nas despesas de 2016, mas sim no equivalente a 18% de toda a arrecadação de impostos. Com isso, procurou-se aumentar os recursos antes de fazer valer o critério da correcção inflacionária, observado apenas a partir de 2018. Levando-se em consideração todos estes factores, o orçamento do Ministério da Educação para o ano corrente chega a 157,4 biliões de reais (cerca de 36,2 biliões de dólares), valor extremamente significativo sob qualquer óptica.

J.A 



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