De todos inquéritos que constam dos planos do Instituto Nacional de Estatística (INE), apenas o Índice de Preços do Consumidor Nacional (IPCN) continua a sair regularmente. Os restantes estão paralisados por falta de verbas.
Um deles é relativo ao primeiro recenseamento Agro-pecuário e Pescas (Rapp), que começou oficialmente a 16 de Agosto do ano passado, e cuja cerimónia foi presidida pelo ministro do Estado para a Coordenação Económica, Manuel Nunes Júnior. Nem a formação dos inquiridores está con- cluída, apesar de a previsão apontar para Abril deste ano. Mas, mesmo com a formação por terminar, a instituição arrancou com o Rapp só que agora está paralisado.
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O VALOR sabe que em situação idêntica se encontra o Recenseamento de Empresas e Estabelecimentos (Rempe), que arrancou a 4 de Março, em Luanda. A conclusão do Rempe está suspensa e os técnicos não vão ao terreno por falta de dinheiro, além de faltarem verbas para pagar a fornecedores e colaboradores.
No início de Outubro do ano passado, o director-adjunto do INE, Paulo Fonseca, previa a conclusão do Rempe para a primeira quinzena desse mês.
Mas isso não aconteceu. Na altura, num evento promovido pelo Ministério da Economia e Planeamento, Paulo Fonseca sublinhou que a
recolha de informação estava a decorrer com 65 equipas diárias no campo, com 30 entrevistas por equipa de quatro recenseadores e que já tinham contabilizado mais de sete mil empresas.
DESPESAS SUPORTADAS POR PARCEIROS INTERNACIONAIS
Desde Outubro, altura da mudança de chefias no INE, que a institui- ção tem a mudança de assinaturas nos bancos em ‘standby’. Camilo Ceita deixou o cargo e foi substituído por Channey Rosa John, provinda do Ministério das Finanças. No en-tanto, a troca de nomes nos bancos ainda não foi efectivada. E com isso também surgem os condicionalismos para fazer pagamentos a eventuais, como a despesa com inquiridores, empresas subcontratadas e outros colaboradores contratados para os inquéritos.
As despesas para eventuais têm sido suportadas por verbas de parceiros internacionais, ou seja, a instituição tem canalizado dinheiro de projectos para fazer face a estes pagamentos.
O VALOR sabe também que há dois anos que o INE não recebe a dotação do Ministério das Finanças, inscrita no Orçamento Geral do Estado, e que serve para despesas correntes, fora os salários. Só os trabalhadores efectivos do instituto têm recebido os salários mensais, por que são suportados pelo Ministério das Finanças.
ACUSAÇÕES DE INGERÊNCIAS
O Ministério da Economia e Planeamento tem conhecimento de todos os problemas que o INE enfrenta. Aliás, o VALOR sabe que o ministro Sérgio Santos, internamente, é acusado de “ingerências”. Já realizou diversas reuniões com técnicos superiores do INE, não de topo, em diversas ocasiões, incluindo aos sábados. Um desses encontros decorreu dias antes da saída de Camilo Ceita da liderança do INE, sem que este tivesse tido conhecimento. O mesmo tem acontecido nos últimos tempos, mesmo com o INE com nova liderança.
De acordo com os estatutos, o INE deve ser independente de qualquer governo, como é prática comum em quase todas as instituições similares, um pouco por todo o mundo.
Contactado pelo VALOR, o ministro Sérgio Santos negou que faça qualquer interferência no INE de que é acusado. O ministro explica que as reuniões no INE fazem parte das responsabilidades do Conselho Nacional de Estatística (CNEST), que se reúne ordinariamente duas vezes ao ano e cuja primeira reunião aconteceu em Maio do ano passado, ainda com o antigo ministro da Economia, Luís da Fonseca.
Sérgio Santos garante que não se reúne no INE independentemente, mas com todos os mem- bros do CNEST que inclui Órgãos Delegados do INE (Odine), Banco Nacional de Angola (BNA) e o
próprio INE. Mas as informações do VALOR contrariam o que afirma o ministro. O VALOR sabe que o ministro reuniu inclusive com responsáveis sindicais do INE. As reuniões do CNEST são formais e organizadas em tempo prévio e não devem ser feitas constantemente como o ministro tem feito.
O VALOR tentou, junto da assessoria do INE, perceber, via oficial, o que se passa e o que leva o instituto ao estado que chegou, mas ao fim de mais de uma semana e com insistência não obteve sucesso.
CEITA SAI E PEDE RESPEITO
Depois de nove anos à frente do INE, o antigo director Camilo Ceita foi afastado. Na hora da saída, pediu respeito. Camilo Ceita garantia, na hora da substituição, que soube que iria deixar o cargo através das redes sociais. E não escondeu a surpresa. Não lhe chegou à mão qualquer comunicação do Ministério da Economia e Planeamento. Mas o comunicado ministerial já circulava na internet dando conta da nomeação Channey Rosa John.
Mais do que surpreendido, Camilo Ceita não escondeu a indignação e escreveu que estava à espera de “algum respeito e consideração”. Num mail endereçado aos antigos colaboradores, a que o VALOR teve acesso, agradeceu os anos em que trabalharam juntos. Camilo Ceita termina por lembrar aos antigos colegas para respeitarem sempre os outros. “Não se esqueçam nunca: respeitem para merecerem respeito”, uma mensagem que foi lida como um recado para quem o substituiu e pela forma como foi substituído.
Não tardaram depois deste episódio as teorias sobre as razões que levaram à exoneração de Camilo Ceita. O renomado economista Alves da Rocha admitiu, num artigo de opinião no Jornal Expansão, que Camilo Ceita tinha sido exonerado por se ter recusado a adulterar as Contas Nacionais do II trimestre do ano passado para o discurso de João Lourenço sobre o Estado da Nação. O economista salientava que, depois desta interdição, deixará de voltar a acreditar na veracidade das estatísticas nacionais. Camilo Ceita nunca confirmou nem desmentiu esta informação, remetendo-se ao silêncio público desde Outubro.
V.E
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