O mandato dos Juízes: A Constituição e o Estatuto interno do Supremo Tribunal

Sobre a matéria dos exercícios e funções dos juízes, a Constituição da República declara que: “os juízes são independentes no exercício das suas funções e apenas devem obediência à Constituição e à lei. Estes mesmos juízes são inamovíveis, não podendo ser transferidos, promovidos, suspensos, reformados ou demitidos senão nos termos da Constituição e da lei” (Art. 179.°, n.°s 1, 2 e 3 CRA), por sua vez a Lei n.º 7/94 de 29 de Abril, no seu artigo 56.°, n.° 1, alínea a, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (CSMJ), estabelece que: “todo o Juíz ou Magistrado, cessa obrigatoriamente as suas funções ao completar 70 anos de idade”.

Estamos perante duas normas na qual precisam ser interpretadas. Sendo a Constituição a Lei Suprema da Nação (Art. 6.° CRA) na qual todas as outras leis (ordinárias, regulamentos e estatutos) devem espelhar-se, obedecer, respeitar e seguir, a lei do Estatuto do Supremo Tribunal sobre a cessação do mandato dos juízes não é conforme  à Constituição e  por isso, é inconstitucional o afastamento do Venerando Juíz Manuel da Costa Aragão, da função de Juíz Presidente do Tribunal Constitucional.

Se recorrermos às normas da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC) , no seu artigo 40.º, n.º 3, alíneas a, b, c, d, dispõe que “os juízes do Tribunal Constitucional, só cessam as suas funções em caso de: morte ou impossibilidade física permanente; renúncia; aceitação de cargo legalmente incompatível com o exercício das suas funções; demissão ou aposentação compulsiva, em consequência de processo disciplinar ou criminal”.
Por outra, a Constituição da República determina que “os juízes do Tribunal Constitucional são designados para um mandato de sete (7) anos, não renovável e gozam das garantias de independência, inamovibilidade, imparcialidade e irresponsabilidade dos juízes dos restantes Tribunais” (Art. 180.º, n.º 4 CRA).

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Em resumo, é determinante percebermos, em primeiro lugar, a natureza do Juíz do Tribunal Constitucional que não é um magistrado ordinário, é um Sujeito chamado para o cumprimento de uma função jurisdicional de apenas sete anos, ao abrigo do artigo 180º da CRA; segundo elemento de força, na hierarquia das fontes existe um princípio de Supremacia da Constituição sobre as leis ordinárias (Art. 7.º CRA). A Constituição ao estabelecer sete anos como limite do exercício da função do Juíz, demonstra que uma lei que estabeleça o contrário é inconstitucional. Um outro facto a considerar de extrema importância, é reforçado pelo Doutor Adlezio Agostinho, PHD em Direito Constitucional que diz: “a Magistratura Constitucional é autonoma, tendo leis e regulamentos próprios”.
A lei ordinária da Magistratura não estabelece limite algum sobre a função do mandato; o único limite são os sete anos, pois o legislador é consciente que ali não existe carreira, existe sim exercício do cumprimento do mandato. Essa interpretação é seguida por todas as jurisdições, concluiu o Doutor Adlezio! A alegação de que  os diplomas foram redigidos e aprovados antes de 2010 e que se deva fazer portanto, uma interpretação actualista de acordo com a lei fundamental da parte de alguns constitucionalistas, não nos parece de tudo determinante porquanto quanto mais for antiga as leis ordinárias em relação a Constituição, mais importante e necessária se poderia fazer uma hermenêutica com base na Constituição vigente que estabelece os sete anos.
Quando a Constituição da República de Angola diz sete anos, não renovável, quer dizer que não é carreira, mas é exercício de função.  De facto, a lei ordinária do Tribunal Constitucional segue de forma harmoniosa a Constituição da República de Angola, determinando em quais situações o Juíz não cumpre os sete anos; em nenhuma delas faz referência a idade de 70 anos;  quanto a essa, diz apenas que por vontade própria e cumprido 1/3 do mandato o Juíz pode interromper a função. Por aquilo que sabemos, o Juíz Presidente do Tribunal Constitucional, ainda não cumpriu 1/3  do seu mandato, faltando-lhe um ano e meio.  

Tendo em conta essas disposições constitucionais, a decisão do Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ) em jubilar Manuel da Costa Aragão, com base no seu Estatuto interno, no passado dia 16 de Abril de 2020,  è inconstitucional; é contrário à Constituição porque esta diz que “os juízes não podem ser reformados” e é também incompatível com a Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (LOTC), que diz que “os juízes só cessam as suas funções em casos extraordinários, como: morte ou aposentação compulsiva, etc, etc.

Ipso facto, a saída do Juíz Presidente do Tribunal Constitucional, só seria possível com a alteração da Constituição ou da lei ordinária do próprio Tribunal.  As coisas são tão claras que só não percebe quem não enxergou a natureza do Tribunal Constitucional, dizia o doutor Adlezio.

É inconstitucional! Achamos serem questões políticas e não jurídicas porque de juridicidade está mais que claro.

Por:Leonardo Quarenta & Espírito Santo Quarenta, Especialista  em Direito Constitucional

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