Prestes a abandonar o poder, o antigo Presidente angolano terá mandado elaborar um conjunto de decretos que se destinava a manter sob a sua alçada o controlo indireto da política monetária e cambial do país. A ideia, segundo apurou o Expresso junto do Ministério das Finanças de Angola, passava pela aprovação de quatro decretos presidenciais que Eduardo dos Santos deveria assinar na véspera da investidura do seu sucessor. “Era um presente envenenado para João Lourenço, consubstanciado num rude golpe financeiro”, denuncia uma fonte dos serviços de informações conhecedora do dossiê.
Entre os documentos figurava um decreto que deveria dar lugar à criação de um fundo de investimento estratégico proposto pela MFS — Mais Financial Services, presidido por Jorge Pontes, o testa de ferro de José Filomeno dos Santos, filho do ex-presidente angolano. Ambos foram já constituídos arguidos pela Procuradoria-Geral da República pelo envolvimento na operação de transferência ilegal de 500 milhões de dólares (€409 milhões) do Banco Nacional de Angola (BNA) para uma conta em Londres do Credit Suisse.
Ao abrigo daquele decreto, a MFS propunha-se prestar serviço de “consultoria técnico-financeira ao BNA e propor medidas monetárias” no âmbito de “um estudo minucioso da realidade económica de Angola”. Apoiar o banco central na realização de operações de expansão monetária, gerir a carteira de contratos e de ativos e outras operações no mercado financeiro eram outras das atribuições da MFS.
Criada especialmente para esse fim, esta empresa-fantasma deveria ainda dedicar-se ao licenciamento das operações cambiais do BNA para o exterior. Pela assinatura do contrato, o consórcio constituído pela MFS e pela Resourt Projects Perfetmment recebeu como pagamento 9,1 milhões de dólares (€7,4 milhões).
A criação de uma plataforma eletrónica estava igualmente consagrada num decreto presidencial para fornecer, instalar e gerir a matriz informática. Seguir-se-ia a implementação de um sistema integrado de supervisão cambial. Através deste sistema, “toda e qualquer operação deixava de ser feita pelo BNA e passaria a ser executada pela nova base de dados”, de acordo com fonte do Conselho de Ministros angolano. Competiria a essa base de dados “conceber e concretizar a simplificação e informatização de toda as informações e dados referentes à entrada e saída de divisas e à utilização dos recursos cambiais do país”.
Noutros decretos presidenciais ficariam contemplados a criação de um conselho nacional de supervisão do investimento em ativos estratégicos e a capitalização de projetos de investimento associados ao Fundo de José Filomeno dos Santos.
“Ao entregar a gestão das reservas internacionais líquidas do BNA a uma gestão privada, estava-se a violar uma disposição legal da competência do Parlamento, a única entidade com competência para alterar a lei cambial”, adverte o jurista Januário Fortunato.
A operação só seria abortada graças à intervenção de uma assessora jurídica de Eduardo dos Santos, que alertou para a ilegalidade de uma decisão que acarretaria consequências nefastas para a imagem de Angola junto das instituições financeiras internacionais.
O Expresso tentou falar com José Eduardo dos Santos e o filho, mas tal não foi possível até ao fecho desta edição. EXPRESSO
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